Mudar a forma de ensinar e de aprender com
tecnologias
Transformar as aulas em pesquisa e comunicação presencial-virtual
Transformar as aulas em pesquisa e comunicação presencial-virtual
Especialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância
Texto que inspirou o capítulo primeiro do
livro: MORAN, José Manuel, MASETTO, Marcos e BEHRENS, Marilda. Novas
Tecnologias e Mediação Pedagógica. 16ª ed. Campinas: Papirus, 2009, p.11-65
- Apresentação
- Ensinar de
formas diferentes para pessoas diferentes
- Transformar a
aula em pesquisa e comunicação
- Quando vale a
pena encontrar-nos na sala de aula?
- Quando vale a
pena encontrar-nos fisicamente numa sala de aula?
- Educar o
educador
- Educação para
a autonomia e para a cooperação
- Experiências
pessoais de ensino utilizando a Internet
- Alguns
problemas no uso da Internet na educação
- Conclusão
Mudar a forma de
ensinar e de aprender com tecnologias
Transformar as aulas em pesquisa e comunicação presencial-virtual
Transformar as aulas em pesquisa e comunicação presencial-virtual
Especialista em projetos inovadores na
educação presencial e a distância
Texto que inspirou o capítulo primeiro do
livro: MORAN, José Manuel, MASETTO, Marcos e BEHRENS, Marilda. Novas
Tecnologias e Mediação Pedagógica. 16ª ed. Campinas: Papirus, 2009, p.11-65
"Um indivíduo consegue hoje um diploma de
curso superior sem nunca ter aprendido a comunicar-se, a resolver conflitos, a
saber o que fazer com a raiva e outros sentimentos negativos" (Carl
Rogers)
Educar é colaborar para que professores e
alunos nas escolas e organizações - transformem suas vidas em processos
permanentes de aprendizagem. É ajudar os alunos na construção da sua
identidade, do seu caminho pessoal e profissional - do seu projeto de vida, no
desenvolvimento das habilidades de compreensão, emoção e comunicação que lhes
permitam encontrar seus espaços pessoais, sociais e de trabalho e tornar-se
cidadãos realizados e produtivos.
Educamos de verdade quando aprendemos com cada
coisa, pessoa ou ideia que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos, experienciamos,
lemos, compartilhamos e sonhamos; quando aprendemos em todos os espaços em que
vivemos na família, na escola, no trabalho, no lazer, etc. Educamos aprendendo
a integrar em novas sínteses o real e o imaginário; o presente e o passado
olhando para o futuro; ciência, arte e técnica; razão e emoção.
De tudo, de qualquer situação, leitura ou
pessoa podemos extrair alguma informação, experiência que nos pode ajudar a
ampliar o nosso conhecimento, seja para confirmar o que já sabemos, seja para
rejeitar determinadas visões de mundo
Na educação - nas organizações empresariais ou
escolares - buscamos o equilíbrio entre a flexibilidade (que está ligada
ao conceito de liberdade) e a organização (onde há hierarquia, normas,
maior rigidez). Com a flexibilidade procuramos adaptar-nos às diferenças
individuais, respeitar os diversos ritmos de aprendizagem, integrar as
diferenças locais e os contextos culturais. Com a organização, buscamos
gerenciar as divergências, os tempos, os conteúdos, os custos, estabelecemos os
parâmetros fundamentais. Avançaremos mais se soubermos adaptar os programas
previstos às necessidades dos alunos, criando conexões com o cotidiano, com o
inesperado, se transformarmos a sala de aula em uma comunidade de investigação.
Ensinar de formas diferentes para pessoas diferentes
Com a Internet estamos começando a ter que
modificar a forma de ensinar e aprender tanto nos cursos presenciais como nos
de educação continuada, a distância. Só vale a pena estarmos juntos fisicamente
- num curso empresarial ou escolar - quando acontece algo significativo, quando
aprendemos mais estando juntos do que pesquisando isoladamente nas nossas
casas. Muitas formas de ensinar hoje não se justificam mais. Perdemos
tempo demais, aprendemos muito pouco, nos desmotivamos continuamente. Tanto
professores como alunos temos a clara sensação de que em muitas aulas
convencionais perdemos muito tempo.
Podemos modificar a forma de ensinar e de
aprender. Um ensinar mais compartilhado. Orientado, coordenado
pelo professor, mas com profunda participação dos alunos, individual e
grupalmente, onde as tecnologias nos ajudarão muito, principalmente as
telemáticas.
Ensinar e aprender exigem hoje muito mais
flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e
processos mais abertos de pesquisa e de comunicação. Uma das dificuldades
atuais é conciliar a extensão da informação, a variedade das fontes de acesso,
com o aprofundamento da sua compreensão, em espaços menos rígidos, menos
engessados. Temos informações demais e dificuldade em escolher quais são
significativas para nós e conseguir integrá-las dentro da nossa mente e da
nossa vida.
A aquisição da informação, dos dados dependerá
cada vez menos do professor. As tecnologias podem trazer hoje dados, imagens,
resumos de forma rápida e atraente. O papel do professor - o papel principal -
é ajudar o aluno a interpretar esses dados, a relacioná-los, a
contextualizá-los.
Aprender depende também do aluno, de que ele esteja
pronto, maduro, para incorporar a real significação que essa informação tem
para ele, para incorporá-la vivencialmente, emocionalmente. Enquanto a
informação não fizer parte do contexto pessoal - intelectual e emocional - não
se tornará verdadeiramente significativa, não será aprendida verdadeiramente.
Hoje temos um amplo conhecimento horizontal -
sabemos um pouco de muitas coisas, um pouco de tudo. Falta-nos um conhecimento
mais profundo, mais rico, mais integrado; o conhecimento diferente, desvendador,
mais amplo em todas as dimensões.
Uma parte das nossas dificuldades em ensinar
se deve também a mantermos no nível organizacional e interpessoal formas de
gerenciamento autoritário, pessoas que não estão acompanhando profundamente as
mudanças na educação, que buscam o sucesso imediato, o lucro fácil, o marketing
como estratégia principal.
O professor é um facilitador, que procura
ajudar a que cada um consiga avançar no processo de aprender. Mas tem os
limites do conteúdo programático, do tempo de aula, das normas legais. Ele tem
uma grande liberdade concreta, na forma de conseguir organizar o processo de
ensino-aprendizagem, mas dentro dos parâmetros básicos previstos socialmente.
O aluno não é unicamente nosso cliente que
escolhe o que quer. É um cidadão em desenvolvimento. Há uma interação entre as
expectativas dos alunos, as expectativas institucionais e sociais e as
possibilidades concretas de cada professor. O professor procura facilitar a
fluência, a boa organização e adaptação do curso a cada aluno, mas há limites
que todos levarão em consideração. A personalidade do professor é decisiva para
o bom êxito do ensino-aprendizagem. Muitos não sabem explorar todas as
potencialidades da interação.
Se temos que trabalhar com um grupo, não
poderemos provavelmente preencher todas as expectativas individuais.
Procuraremos encontrar o ponto de equilíbrio entre as expectativas sociais, as
do grupo e as individuais. Quando há uma diferença intransponível entre as
expectativas grupais e algumas expectativas individuais, incontornáveis a curto
prazo, ainda assim, na educação, procuraremos adaptar flexivelmente as
propostas, as técnicas, a avaliação (prazo maior, diferentes formas de
avaliação). Somente no fim deste processo podemos julgar negativamente -
reprovar o outro. É cômodo para o educador jogar sempre a culpa nos alunos,
dizendo que não estão preparados, que são problemáticos. A criatividade está em
encontrar formas de aproximação dos alunos às nossas propostas, à nossa pessoa.
Não podemos dar aula da mesma forma para
alunos diferentes, para grupos com diferentes motivações. Precisamos
adaptar nossa metodologia, nossas técnicas de comunicação a cada grupo. Tem
alunos que estão prontos para aprender o que temos a oferecer. É a situação
ideal, onde é fácil obter a sua colaboração. Alunos mais maduros, que
necessitam daquele curso ou que escolheram aquela matéria livremente facilitam
nosso trabalho, nos estimulam, colaboram mais facilmente.
Outros alunos, no início do curso podem estar
distantes, mas sabendo chegar até eles, mostrando-nos abertos, confiantes e
motivadores, sensibilizando-os para o que eles vão aprender no nosso curso,
respondem bem e se dispõem a participar. A partir daí torna-se fácil ensinar.
Existem outros que não estão prontos, que são
imaturos ou estão distantes das nossas propostas. Procuraremos aproximá-las o
máximo que pudermos deles, partindo do que eles valorizam, do que para eles é
importante. Mas se, mesmo assim, a resposta é fria, poderemos apelar para
algumas formas de impor tarefas, prazos, avaliações mais freqüentes, de forma
madura, mostrando que é pelo bem deles e não como forma de vingança nossa. O
professor pode impor sem ser autoritário, sem humilhar, colocando as tarefas de
forma clara, calma e justificada. A imposição é um último recurso do professor,
não primeiro e único. Sempre que for possível, avançaremos mais pela interação,
pela colaboração, pela pesquisa compartilhada do que pela imposição.
Vejo as aulas nas organizações - como
processos contínuos de comunicação e de pesquisa, onde vamos construindo o
conhecimento em um equilíbrio entre o individual e o grupal, entre o
professor-coordenador-facilitador e os alunos-participantes ativos.
Aula-pesquisa, onde professor motiva, incentiva, dá os primeiros passos para
sensibilizar o aluno para o valor do que vamos fazer, para a importância da
participação do aluno neste processo. Aluno motivado e com participação ativa
avança mais, facilita todo o nosso trabalho. Depois da sensibilização - verbal,
audiovisual - o aluno - às vezes individualmente e outras em pequenos grupos -
procura suas informações, faz a sua pesquisa na Internet, em livros, em contato
com experiências significativas, com pessoas ligadas ao tema..
Os grandes temas da matéria são coordenados
pelo professor, iniciados pelo professor, motivados pelo professor, mas
pesquisados pelos alunos, às vezes todos simultaneamente; às vezes, em grupos;
às vezes, individualmente.
Uma parte da pesquisa pode ser feita "ao
vivo" (juntos fisicamente); outras, "off line" (cada um pesquisa
no seu espaço e tempo preferidos). Ao vivo, o professor está atento às
descobertas, às dúvidas, ao intercâmbio das informações (os alunos pesquisam,
escolhem, imprimem), ao tratamento das informações. O professor ajuda,
problematiza, incentiva, relaciona.
Ao mesmo tempo, o professor coordena as
trocas, os alunos relatam suas descobertas, socializam suas dúvidas, mostram os
resultados de pesquisa. Se possível, todos recebem uma seleção dos
melhores materiais descobertos pelos alunos, junto com os do professor (textos
impressos ou colocados a disposição pelo professor ou indicados em sites da
Internet).
Os alunos levam para casa os textos, onde
aprofundam a sua leitura, fazem novas sínteses, colocam os problemas que os
textos suscitam, os relacionam com a sua realidade.
Essa pesquisa é comunicada em classe para os
colegas e o professor procura ajudar a contextualizar, a ampliar o universo
alcançado pelos alunos, a problematizar, a descobrir novos significados no
conjunto das informações trazidas. Esse caminho de ida e volta, onde todos se
envolvem, participam é fascinante, criativo, cheio de novidades e de avanços. O
conhecimento que é elaborado a partir da própria experiência se torna muito
mais forte e definitivo em nós.
Junto com a pesquisa coletiva, o professor
incentiva a pesquisa individual ou projetos de grupo. Cada aluno
-pessoalmente ou em dupla - escolhe um tema mais específico da matéria e que é
do interesse também do aluno. Esse tema é pesquisado pelo aluno com orientação
do professor. É apresentado à classe. É distribuído aos colegas. É divulgado na
Internet.
É importante neste processo dinâmico de
aprender pesquisando, utilizar todos os recursos, todas as técnicas possíveis
por cada professor, por cada instituição, por cada classe. Vale a pena
descobrir as competências dos alunos que temos em cada classe, que
contribuições podem dar ao nosso curso. Não vamos impor um projeto fechado de
curso, mas um programa com as grandes diretrizes delineadas e onde vamos
construindo caminhos de aprendizagem em cada etapa, estando atentos - professor
e alunos - para avançar da forma mais rica possível em cada momento.
Iremos combinando daqui em diante cursos
presenciais com virtuais, períodos de pesquisa mais individual com outros de
pesquisa e comunicação conjunta. Alguns cursos poderemos fazê-los sozinhos com
a orientação virtual de um tutor e em outros será importante compartilhar
vivências, experiências, ideias.
Como regra geral, no começo e no final de um
novo tema, de um assunto importante. No início, para colocar esse tema dentro
de um contexto maior, para motivar os alunos, para que percebam o que vamos
pesquisar e para organizar como vamos pesquisá-lo. Os alunos, iniciados ao novo
tema e motivados, o pesquisam, sob a supervisão do professor e voltam a aula
depois de um tempo para trazer os resultados da pesquisa, para colocá-los em
comum. É o momento final do processo, de trabalhar em cima do que os alunos
apresentaram, de complementar, questionar, relacionar o tema com os demais.
Vale a pena encontrar-nos no início de um
processo específico de aprendizagem e no final, na hora da troca, da contextualização.
Uma parte das aulas pode ser substituída por acompanhamento, monitoramento de
pesquisa, onde o professor dá subsídios para os alunos irem além das primeiras
descobertas, para ajudá-los nas suas dúvidas. Isso pode ser feito pela
Internet, por telefone ou pelo contato pessoal com o professor.
Na medida em que avançam as tecnologias de
comunicação virtual, o conceito de presencialidade também se altera. Podemos
ter professores externos compartilhando determinadas aulas, um professor de
fora "entrando" por videoconferência na minha aula. Haverá um
intercâmbio muito maior de professores, onde cada um colabora em algum ponto
específico, muitas vezes a distância.
O conceito de curso, de aula também muda. Hoje
entendemos por aula um espaço e tempo determinados. Esse tempo e espaço cada
vez serão mais flexíveis. O professor continua "dando aula" quando
está disponível para receber e responder mensagens dos alunos, quando cria uma
lista de discussão e alimenta continuamente os alunos com textos, páginas da Internet,
fora do horário específico da sua aula. Há uma possibilidade cada vez mais
acentuada de estarmos todos presentes em muitos tempos e espaços diferentes,
quando tanto professores quanto os alunos estão motivados e entendem a aula
como pesquisa e intercâmbio, supervisionados, animados, incentivados pelo
professor.
Poderemos também oferecer cursos
predominantemente presenciais e outros predominantemente virtuais. Isso
dependerá do tipo de matéria, das necessidades concretas de cobrir falta de
profissionais em áreas específicas ou de aproveitar melhor especialistas de
outras instituições que seria difícil contratar.
De um professor espera-se, em primeiro lugar,
que seja competente na sua especialidade, que conheça a matéria, que esteja atualizado.
Em segundo lugar, que saiba comunicar-se com os seus alunos, motivá-los,
explicar o conteúdo, manter o grupo atento, entrosado, cooperativo, produtivo.
Muitos se satisfazem em ser competentes no
conteúdo de ensino, em dominar determinada área de conhecimento e em
aprimorar-se nas técnicas de comunicação desse conteúdo. São os professores bem
preparados, que prestam um serviço importante socialmente em troca de uma
remuneração, em geral, mais baixa do que alta.
Na educação, escolar ou empresarial,
precisamos de pessoas que sejam competentes em determinadas áreas de
conhecimento, em comunicar esse conteúdo aos seus alunos, mas também que saibam
interagir de forma mais rica, profunda, vivencial, facilitando a compreensão e
a prática de formas autênticas de viver, de sentir, de aprender, de
comunicar-se. Ao educar facilitamos, num clima de confiança, interações
pessoais e grupais que ultrapassam o conteúdo para, através dele, ajudar a
construir um referencial rico de conhecimento, de emoções e de práticas.
As mudanças na educação dependem, em primeiro
lugar, de termos educadores maduros intelectual e emocionalmente, pessoas
curiosas, entusiasmadas, abertas, que saibam motivar e dialogar. Pessoas com as
quais valha a pena entrar em contato, porque dele saímos enriquecidos.
Os grandes educadores atraem não só pelas suas
ideias, mas pelo contato pessoal. Dentro ou fora da aula chamam a atenção. Há
sempre algo surpreendente, diferente no que dizem, nas relações que
estabelecem, na sua forma de olhar, na forma de comunicar-se. São um poço
inesgotável de descobertas.
Enquanto isso, boa parte dos professores é
previsível, não nos surpreende; repete fórmulas, sínteses.
O contato com educadores entusiasmados atrai,
contagia, estimula, os torna próximos da maior parte dos alunos. Mesmo que não
concordemos com todas as suas ideias, os respeitamos.
As primeiras reações que o bom professor e
educador despertam no aluno são a confiança, a admiração e o entusiasmo. Isso
facilita enormemente o processo de ensino-aprendizagem.
As mudanças na educação dependem também de
termos administradores, diretores e coordenadores mais abertos, que entendam
todas as dimensões que estão envolvidas no processo pedagógico, além das
empresariais ligadas ao lucro; que apoiem os professores inovadores, que
equilibrem o gerenciamento empresarial, tecnológico e o humano, contribuindo
para que haja um ambiente de maior inovação, intercâmbio e comunicação.
As mudanças na educação dependem também dos
alunos. Alunos curiosos, motivados, facilitam enormemente o processo, estimulam
as melhores qualidades do professor, tornam-se interlocutores lúcidos e
parceiros de caminhada do professor-educador.
Alunos motivados aprendem e ensinam, avançam
mais, ajudam o professor a ajudá-los melhor. Alunos que provêm de famílias
abertas, que apóiam as mudanças, que estimulam afetivamente os filhos, que
desenvolvem ambientes culturalmente ricos, aprendem mais rapidamente, crescem
mais confiantes e se tornam pessoas mais produtivas.
A educação avança pouco - nas organizações
empresariais e nas escolas - porque ainda estamos profundamente inseridos em
organizações autoritárias, em processos de ensino e aprendizagem controladores,
com educadores pouco livres, mal resolvidos, que repetem mais do que pesquisam,
que impõem mais do que se comunicam, que não acreditam no seu próprio potencial
nem no dos seus alunos, que desconhecem o quanto eles e seus alunos podem
realizar!.
Um dos eixos das mudanças na educação passa
pela transformação da educação em um processo de comunicação autêntica, aberta
entre professores e alunos, principalmente, mas também incluindo
administradores e a comunidade (todos os envolvidos no processo
organizacional). Só vale a pena ser educador dentro de um contexto
comunicacional participativo, interativo, vivencial. Só aprendemos
profundamente dentro deste contexto. Não vale a pena ensinar dentro de
estruturas autoritárias e ensinar de forma autoritária. Pode até ser mais
eficiente a curto prazo - os alunos aprendem rapidamente determinados conteúdos
programáticos - mas não aprendem a ser pessoas, a ser cidadãos.
Sei que parece uma ingenuidade falar de
comunicação autêntica numa sociedade altamente competitiva, onde cada um se
expõe até determinado ponto e, na maior parte das vezes, se esconde, em
processos de comunicação aparentes, cheios de desconfiança, quando não de
interações destrutivas. As organizações que quiserem evoluir terão que aprender
a reeducar-se em ambientes mais significativos de confiança, de cooperação, de
autenticidade. Isso as fará crescer mais, estar mais atentas às mudanças
necessárias.
Com ou sem tecnologias avançadas podemos
vivenciar processos participativos de compartilhamento de ensinar e aprender
(poder distribuído) através da comunicação mais aberta, confiante, de motivação
constante, de integração de todas as possibilidades da
aula-pesquisa/aula-comunicação, num processo dinâmico e amplo de informação
inovadora, reelaborada pessoalmente e em grupo, de integração do objeto de estudo
em todas as dimensões pessoais: cognitivas, emotivas, sociais, éticas e
utilizando todas as habilidades disponíveis do professor e do aluno.
É importante educar para a autonomia,
para que cada um encontre o seu próprio ritmo de aprendizagem e, ao mesmo tempo,
é importante educar para a cooperação, para aprender em grupo, para
intercambiar idéias, participar de projetos, realizar pesquisas em conjunto.
Só podemos educar para a autonomia, para a
liberdade com autonomia e liberdade. Uma das tarefas mais urgentes é educar o
educador para uma nova relação no processo de ensinar e aprender, mais aberta,
participativa, respeitosa do ritmo da cada aluno, das habilidades específicas
de cada um.
O caminho para a autonomia acontece combinando
equilibradamente a interação e a interiorização. Pela interação aprendemos,
nos expressamos, confrontamos nossas experiências, ideias, realizações; pela
interação buscamos ser aceitos, acolhidos pela sociedade, pelos colegas, por
alguns grupos significativos. Pela interiorização fazemos a integração de tudo,
das idéias, interações, realizações em nós, vamos encontrando nossa síntese,
nossa identidade, nossa marca pessoal, nossa diferença.
A tecnologia nos propicia interações mais
amplas, que combinam o presencial e o virtual. Somos solicitados continuamente
a voltar-nos para fora, a distrair-nos, a copiar modelos externos, o que
dificulta o processo de interiorização, de personalização. O educador precisa
estar atento para utilizar a tecnologia como integração e não como distração ou
fuga.
O educador autêntico é humilde e confiante.
Mostra o que sabe e, ao mesmo tempo está atento ao que não sabe, ao novo.
Mostra para o aluno a complexidade do aprender, a sua ignorância, suas
dificuldades. Ensina, aprendendo a relativizar, a valorizar a diferença, a
aceitar o provisório. Aprender é passar da incerteza a uma certeza provisória
que dá lugar a novas descobertas e a novas sínteses.
Venho desenvolvendo algumas experiências no
ensino de graduação e de pós-graduação na Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo. Criei uma página pessoal na Internet, no endereço
www.eca.usp.br/prof/moran. Nela constam as disciplinas de pós-graduação - Redes
eletrônicas na Educação e Novas Tecnologias para uma Nova Educação -
e três de graduação - Novas Fronteiras da Televisão, Legislação e
Ética do Radialismo e Mercadologia de Rádio e Televisão - com o
programa e alguns textos meus e dos meus alunos. O roteiro básico é o seguinte:
no começo do semestre, cada aluno escolhe um assunto específico dentro da
matéria, vai pesquisando-o na Internet e na biblioteca. Ao mesmo tempo,
pesquisamos também temas básicos do curso. O aluno apresenta os resultados da
sua pesquisa específica na classe e depois pode divulgá-los, se quiser, através
da Internet.
Disponho de duas salas de aula com dez
computadores em uma e quatorze em outra, ligados à Internet por fibra ótica,
para vinte alunos, em média. Utilizamos essa sala a cada duas ou três semanas.
As outras aulas acontecem na sala convencional.
O fato de ver o seu nome na Internet e a
possibilidade de divulgar os seus trabalhos e pesquisas, exerce uma forte
motivação nos alunos, os estimula a participar mais em todas as atividades do
curso. Enquanto preparam os trabalhos pessoais, vou desenvolvendo com eles
algumas atividades.
Começamos com uma aula introdutória para os
que não estão familiarizados com a Internet. Nela aprendemos a conhecer e a
usar as principais ferramentas. Fazemos pesquisa livre, em vários programas de
busca. Cadastramos a cada aluno para que tenha o seu e mail pessoal (na
própria universidade ou em sites que oferecem endereços eletrônicos
gratuitamente).
Num segundo momento, todos pesquisamos um
tópico importante do programa. É importante sensibilizar o aluno antes
para o que se quer conseguir neste momento, neste tópico. Se o aluno tem claro
ou encontra valor no que vai pesquisar, o fará com mais rapidez e eficiência. O
professor precisa estar atento, porque a tendência na Internet é para a dispersão
fácil. O intercâmbio constante de resultados, a supervisão do professor podem
ajudar a obter melhores resultados. Eles vão gravando os endereços, artigos e
imagens mais interessantes em disquete e também fazem anotações escritas, com
rápidos comentários sobre o que estão salvando. As descobertas mais importantes
são comunicadas aos colegas. Imprimem os textos mais significativos. No final,
os alunos comunicam os principais resultados da sua busca e encontramos os
principais pontos de apoio para analisar o tema do dia. Professor e alunos
relacionam as coincidências e divergências entre os resultados encontrados e as
informações já conhecidas em reflexões anteriores, em livros e revistas.
O meu papel é o de acompanhar cada aluno,
incentivá-lo, resolver suas dúvidas, divulgar as melhores descobertas. As aulas na
Internet se alternam com as aulas habituais, onde acrescentamos textos
escritos, vídeos para aprofundar os temas pesquisados inicialmente na Internet.
Posteriormente, cada aluno desenvolve um tema específico de pesquisa, que ele
escolhe, conciliando o seu interesse pessoal e o da matéria. É interessante que
os alunos escolham algum assunto dentro do programa que esteja mais próximo do
que eles valorizam mais. Essas pesquisas podem ser realizadas dentro e fora do
período de aula. Estou junto com eles, dando dicas, tirando dúvidas, anotando
descobertas. Esses temas específicos são mais tarde apresentados em classe para
os colegas. O professor complementa, questiona, relaciona essas apresentações com
a matéria como um todo. Alguns alunos criam suas páginas pessoais e outros
entregam somente os resultados das suas pesquisas para colocá-los na minha
página.
Além das aulas, acontece um estimulante
processo de comunicação virtual, junto com o presencial. Eles podem
pesquisar em uma sala especial em qualquer horário, se houver máquinas livres.
Os alunos me procuram mais para atendimento específico na minha sala, e também
enviam mensagens eletrônicas. Como todos têm e-mail, envio com frequência
textos, endereços, ideias, sugestões em uma lista que crio para o curso. Isso
estimula, principalmente na pós-graduação, o intercâmbio, a troca também entre
colegas, a inserção de novos materiais trazidos pelos próprios alunos.
A navegação precisa de bom senso, gosto estético
e intuição. Bom senso para não deter-se, diante de
tantas possibilidades, em todas elas, sabendo selecionar, em rápidas
comparações, as mais importantes. A intuição é um radar que vamos desenvolvendo
de "clicar" o mouse nos links que nos levarão mais perto do
que procuramos. A intuição nos leva a aprender por tentativa, acerto e erro. Às
vezes passaremos bastante tempo sem achar algo importante e, de repente, se
estivermos atentos, conseguiremos um artigo fundamental, uma página
esclarecedora. O gosto estético nos ajuda a reconhecer e a apreciar páginas
elaboradas com cuidado, com bom gosto, com integração de imagem e texto.
Principalmente para os alunos, o estético é uma qualidade fundamental de
atração. Uma página bem apresentada, com recursos atraentes, é imediatamente
selecionada, pesquisada.
Ensinar utilizando a Internet exige uma forte
dose de atenção do professor. Diante de tantas possibilidades de busca, a
própria navegação se torna mais sedutora do que o necessário trabalho de
interpretação. Os alunos tendem a dispersar-se diante de tantas conexões
possíveis, de endereços dentro de outros endereços, de imagens e textos que se
sucedem ininterruptamente. Tendem a acumular muitos textos, lugares, ideias,
que ficam gravados, impressos, anotados. Colocam os dados em sequência mais do
que em confronto. Copiam os endereços, os artigos uns ao lado dos outros, sem a
devida triagem.
Creio que isso se deve a uma primeira etapa de
deslumbramento diante de tantas possibilidades que a Internet oferece. É mais
atraente navegar, descobrir coisas novas do que analisá-las, compará-las,
separando o que é essencial do acidental, hierarquizando idéias, assinalando
coincidências e divergências. Por outro lado, isso reforça uma atitude
consumista dos jovens diante da produção cultural audiovisual. Ver equivale, na
cabeça de muitos, a compreender e há um certo ver superficial, rápido, guloso
sem o devido tempo de reflexão, de aprofundamento, de cotejamento com outras
leituras. Os alunos se impressionam primeiro com as páginas mais bonitas, que
exibem mais imagens, animações, sons. As imagens animadas exercem um fascínio
semelhante às do cinema, vídeo e televisão. Os lugares menos atraentes
visualmente costumam ser deixados em segundo plano, o que acarreta, às vezes, perda
de informações de grande valor.
A Internet é uma tecnologia que facilita a
motivação dos alunos, pela novidade e pelas possibilidades inesgotáveis de
pesquisa que oferece. Essa motivação aumenta se o professor a faz em um clima
de confiança, de abertura, de cordialidade com os alunos. Mais que a tecnologia
o que facilita o processo de ensino-aprendizagem é a capacidade de comunicação
autêntica do professor, de estabelecer relações de confiança com os seus
alunos, pelo equilíbrio, competência e simpatia com que atua.
O aluno desenvolve a aprendizagem cooperativa,
a pesquisa em grupo, a troca de resultados. A interação bem sucedida aumenta a
aprendizagem. Em alguns casos há uma competição excessiva, monopólio de
determinados alunos sobre o grupo. Mas, no conjunto, a cooperação prevalece.
A Internet ajuda a desenvolver a intuição, a
flexibilidade mental, a adaptação a ritmos diferentes. A intuição,
porque as informações vão sendo descobertas por acerto e erro, por conexões
"escondidas". As conexões não são lineares, vão
"linkando-se" por hipertextos, textos interconectados, mas ocultos,
com inúmeras possibilidades diferentes de navegação. Desenvolve a
flexibilidade, porque a maior parte das sequências são imprevisíveis, abertas.
A mesma pessoa costuma ter dificuldades em refazer a mesma navegação duas
vezes. Ajuda na adaptação a ritmos diferentes: a Internet permite a pesquisa
individual, em que cada aluno vai no seu próprio ritmo e a pesquisa em grupo,
em que se desenvolve a aprendizagem colaborativa.
Na Internet também desenvolvemos formas
novas de comunicação, principalmente escrita. Escrevemos de forma mais
aberta, hipertextual, conectada, multilinguística, aproximando texto e imagem.
Agora começamos a incorporar sons e imagens em movimento. A possibilidade de
divulgar páginas pessoais e grupais na Internet gera uma grande motivação,
visibilidade, responsabilidade para professores e alunos. Todos se esforçam por
escrever bem, por comunicar melhor as suas ideias, para serem bem aceitos, para
"não fazer feio". Alguns dos endereços mais interessantes ou
visitados da Internet no Brasil são feitos por adolescentes ou jovens.
Outro resultado comum à maior parte dos
projetos na Internet confirma a riqueza de interações que surgem, os
contatos virtuais, as amizades, as trocas constantes com outros colegas, tanto
por parte de professores como dos alunos. Os contatos virtuais se transformam,
quando é possível, em presenciais. A comunicação afetiva, a criação de amigos
em diferentes países se transforma em um grande resultado individual e coletivo
dos projetos.
Há uma certa confusão entre informação e
conhecimento. Temos muitos dados, muitas informações disponíveis. Na
informação os dados estão organizados dentro de uma lógica, de um código, de
uma estrutura determinada. Conhecer é integrar a informação no nosso
referencial, no nosso paradigma, apropriando-a, tornando-a significativa para
nós. O conhecimento não se passa, o conhecimento se cria, se constrói.
Alguns alunos não aceitam facilmente essa
mudança na forma de ensinar e de aprender. Estão acostumados a
receber tudo pronto do professor, e esperam que ele continue "dando
aula", como sinônimo de ele falar e os alunos escutarem. Alguns
professores também criticam essa nova forma, porque parece uma forma de não dar
aula, de ficar "brincando" de aula...
Há facilidade de dispersão. Muitos
alunos se perdem no emaranhado de possibilidades de navegação. Não procuram o
que está combinado deixando-se arrastar para áreas de interesse pessoal. É
fácil perder tempo com informações pouco significativas, ficando na periferia
dos assuntos, sem aprofundá-los, sem integrá-los num paradigma consistente.
Conhecer se dá ao filtrar, selecionar, comparar, avaliar, sintetizar,
contextualizar o que é mais relevante, significativo.
Constato também a impaciência de muitos
alunos por mudar de um endereço para outro. Essa impaciência os leva a
aprofundar pouco as possibilidades que há em cada página encontrada. Os alunos,
principalmente os mais jovens, "passeiam" pelas páginas da Internet,
descobrindo muitas coisas interessantes, enquanto deixam por afobação outras
tantas, tão ou mais importantes, de lado.
Podemos ensinar e aprender com programas que
incluam o melhor da educação presencial com as novas formas de comunicação
virtual. Há momentos em que vale a pena encontrar-nos
fisicamente,- no começo e no final de um assunto ou de um curso. Há outros em
que aprendemos mais estando cada um no seu espaço habitual, mas conectados com
os demais colegas e professores, para intercâmbio constante, tornando real o
conceito de educação permanente. Ensino a distância não é só um
"fast-food" onde o aluno vai lá e se serve de algo pronto. Ensino
a distância é ajudar os participantes a que equilibrem as necessidades e
habilidades pessoais com a participação em grupos presenciais e virtuais onde
avançamos rapidamente, trocamos experiências, dúvidas e resultados.
Tanto nos cursos convencionais como nos a
distância teremos que aprender a lidar com a informação e o conhecimento de
formas novas, pesquisando muito e comunicando-nos constantemente. Isso nos fará
avançar mais rapidamente na compreensão integral dos assuntos específicos,
integrando-os num contexto pessoal, emocional e intelectual mais rico e transformador.
Assim poderemos aprender a mudar nossas ideias, sentimentos e valores onde se
fizer necessário.
É importante sermos professores-educadores com
um amadurecimento intelectual, emocional e comunicacional que facilite todo o
processo de organização da aprendizagem. Pessoas abertas, sensíveis, humanas,
que valorizem mais a busca que o resultado pronto, o estímulo que a repreensão,
o apoio que a crítica, capazes de estabelecer formas democráticas de pesquisa e
de comunicação.
Necessitamos de muitas pessoas livres nas
empresas e escolas que modifiquem as estruturas arcaicas, autoritárias do
ensino escolar e gerencial -. Só pessoas livres, autônomas - ou em processo de
libertação - podem educar para a liberdade, podem educar para a autonomia,
podem transformar a sociedade. Só pessoas livres merecem o diploma de educador.
Faremos com as tecnologias mais avançadas o
mesmo que fazemos conosco, com os outros, com a vida. Se somos pessoas abertas,
as utilizaremos para comunicar-nos mais, para interagir melhor. Se somos
pessoas fechadas, desconfiadas, utilizaremos as tecnologias de forma defensiva,
superficial. Se somos pessoas autoritárias, utilizaremos as tecnologias para
controlar, para aumentar o nosso poder. O poder de interação não está
fundamentalmente nas tecnologias mas nas nossas mentes.
Ensinar com as novas mídias será uma
revolução, se mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino,
que mantêm distantes professores e alunos. Caso contrário conseguiremos dar um
verniz de modernidade, sem mexer no essencial. A Internet é um novo meio de
comunicação, ainda incipiente, mas que pode ajudar-nos a rever, a ampliar e a
modificar muitas das formas atuais de ensinar e de aprender.
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