AQUI E AGORA TEM

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

CONCURSO PÚBLICO - www.upenet.com.br

Olinda vai contratar 344 novos servidores.Há vagas para médicos, agentes de trânsito e professores. Salários vão de R$545 a R$7.716 . Inscrição começa hoje e segue até 13 de março. Fonte: JC - Cidades de 16 de Fevereiro 2011

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

XICÃO XUKURU: “Ele foi plantado para que dele nasça novos guerreiros”

(para Jornal Igreja Nova. Recife, abril, 2005). XICÃO XUKURU: “Ele foi plantado para que dele nasça novos guerreiros” O dia 20 de maio é de luto para o povo Xukuru do Ororubá em Pesqueira. Era uma quarta-feira, um dia como outro qualquer da feira semanal na cidade, momento em que os índios xukurus descem de suas aldeias na Serra do Ororubá para comercializar seus produtos, comprar os gêneros que necessitam, resolver alguma pendência, etc. Nesse dia em 1998, quando o Cacique Xicão estacionava o carro na frente da casa de sua irmã, no Bairro Xukurus, um estranho se aproximou e a queima roupa disparou vários tiros assassinando o Cacique ainda dentro do veículo, fugindo o pistoleiro em seguida. Com o Cacique Xicão, o povo Xukuru a partir dos anos 1980 retomou a mobilização por suas terras secularmente invadidas por fazendeiros. Após a participação na campanha da Assembléia Nacional Constituinte, com a expressiva liderança e atuação do Cacique, motivados pelas conquistas na Constituição de 1988, os Xukuru articulados com setores da sociedade civil, como o CIMI (Conselho Indigenista Missionário, órgão anexo à CNBB), iniciaram a retomada de seu território tradicional, reocupando áreas de várias fazendas. A liderança de Xicão atraiu a ira dos fazendeiros, muitos deles membros da oligarquia de Pesqueira. Ele passou a receber várias ameaças de morte. Mesmo após o brutal assassinato de Xicão e posteriormente do líder Chico Quelé em agosto/2001, embora bastante abalado, o povo Xukuru continuou por meio da articulação interna, o processo de organização e mobilização pela conquista de seus direitos, de suas terras hoje reocupadas em cerca de 85%. Por essa razão, o 20 de maio é também um dia de reconhecimento e afirmação indígena, de protesto em memória do Cacique Xicão, pela impunidade das violências contra os povos indígenas e suas lideranças. Nesse sentido, anualmente ocorre a Assembléia do povo Xukuru quando são discutidos os problemas e elegidas as prioridades de trabalho para os próximos meses. Após um ato religioso no centro da mata na Aldeia Pedra D’ Água, local em que Xicão foi “plantado”, é realizada uma grande caminhada, com a participação massiva dos Xukuru, além de indígenas de outras delegações de várias partes do Brasil, aliados e muitas pessoas solidárias com os povos indígenas, que descem da Serra do Ororubá, passam pelas ruas centrais de Pesqueira e vão até o local onde Xicão foi assassinado, onde um multidão fazem um ato público em sua memória. A leitura da trajetória de atuação do Cacique Xicão nos faz lembrar de outras lideranças, a exemplo de Margarida Maria Alves, camponesa, líder sindical em Alagoa Grande/PB, assassinada a mando de fazendeiros nos anos de 1980, que afirmava “morro, mas não fujo da luta!”. Como Santos Dias, líder operário, assassinado pela polícia, na mesma época, durante uma greve dos metalúrgicos em São Paulo, e de tantas outras lideranças mortas na defesa de uma sociedade plural, de igualdade, justiça e dignidade para todos/as. A persistência do Cacique Xicão, de Chico Quelé, o empenho, a luta, suas vidas e de tantos outros/as que lutaram pelo reconhecimento dos direitos indígenas, da justiça e vida plena, não foi em vão: “Do sangue de Margarida, margaridas!” e como dizem os Xukuru sobre Xicão, “ele não foi enterrado, ele foi plantado, para que dele nasça novos guerreiros!”. Somos chamados/as para testemunhar a concretização dessas afirmações no próximo dia 20 de maio indo a Pesqueira. ____________________________ Edson Silva é professor no Col. de Aplicação/CENTRO DE EDUCAÇÃO-UFPE. E-mail: edson.edsilva@gmail.com

XUKURU DO ORORUBÁ: OS VELHOS NÃO MORREM, SE ENCANTAM...

(publicado in Jornal Porantim. Brasília, CIMI/DF, nº. 279,outubro 2005, p.7). XUKURU DO ORORUBÁ: OS VELHOS NÃO MORREM, SE ENCANTAM... No povo Xukuru do Ororubá (Pesqueira/PE) desde muito tempo, antes do escritor Guimarães Rosa ter descoberto, os Xukuru acreditam: dois importantes idosos para a história desse povo partiram para o “reino dos Encantados”. Um deles “Seu” Herculano, respeitado pela sua sabedoria, acompanhante do Cacique “Xicão”, moradores da Aldeia Pedra D’Água, desde o início participou das mobilizações contemporâneas que garantiram a demarcação das terras desse povo. A outra importante referência “Seu” Cícero Pereira, foi o pai do Cacique Xicão, assassinado a mando de fazendeiros invasores do território indígena, e avô do atual Cacique Marcos. Possuidor de uma memória prodigiosa, “Seu” Cícero em várias conversas lembrava com muitos detalhes do passado Xukuru, dos tempos difíceis com as perseguições dos fazendeiros. Nascido na Aldeia Cana Brava, ou “Cana Braba”, como ainda hoje chamam os/as mais idosos/as e de onde provém a linhagem do cacicado Xukuru do Ororubá, “Seu Ciço” como era conhecido, filho de uma família numerosa, recordava que desde a infância, assim como muitas crianças da sua época, tinha que trabalhar duro na roça, no pequeno pedaço de terra que possuía, quando não nas terras das fazendas que ocupavam o território Xukuru. “Seu Ciço” falava também das “juntadas”, reunião daqueles moradores que possuíam pequenos lotes, para trabalharem em mutirões de ajuda mútua. Lembrava que quando garoto desceu tantas vezes a Serra do Ororubá em um cavalo com os caçoás carregados de verduras, milho e produtos da roça que vendia na estação do trem em Pesqueira. Mas, como a vida não era só trabalho, recordava também e tão bem com alegria das novenas, das festas animadas ao som das zabumbas, onde além da diversão garantida, se acertava os noivados, futuros casamentos. Ele teve um papel fundamental nas mobilizações contemporâneas dos Xukuru do Ororubá. Quando os Xukuru se organizam em meados de 1980, elegendo o Cacique Xicão, reconhecida e expressiva liderança desse povo com projeção ao nível do país, “Seu Ciço” foi eleito Vice-Cacique. Sua atuação sempre foi discreta, mas garantiu o apoio necessário, muitas vezes também material, para a atuação de Xicão e a organização indígena Xukuru. Por isso ele sempre foi visto como uma importante referência na luta desse povo. Muito abalado e magoado desde o assassinato do Cacique Xicão, doente ele se viu forçado a deixar a aldeia e vir morar na cidade. Mas em sua casa a todos/as recebia com satisfação e sempre disposto a uma longa conversa sobre o passado, a memória Xukuru e por isso era uma grande referência. Vibrava com as conquistas do presente do seu povo e colocava muita esperança no futuro, falando com orgulho da liderança exercida pelo atual jovem Cacique Marcos, seu neto. As partidas de “Seu” Herculano e de “Seu” Cícero nos questionam sobre o que pensamos a respeito das pessoas mais velhas. Como são vistos os/as mais velhos/as nas aldeias? Qual o lugar dos/as idosos/as entre os povos indígenas? Em um mundo onde o/a velho/a, principalmente os/as pobres, em oposição ao novo, ao moderno são descartados, desprezados, vivem na imensa maioria em péssimas condições, a vida, a história, a experiência, o testemunho e a sabedoria de “Seu” Herculano, de “Seu” Cícero, de tantos idosos/as, além de nos questionar, nos lembra que somos sombras do passado e do qual esboçamos o futuro. Talvez por isso os Xukuru do Ororubá afirmem que não enterram, mas “plantam” seus mortos, para que deles “nasçam novos guerreiros”. E “Seu” Herculano e “Seu” Cícero foram plantados ali, no meio da mata sagrada da Aldeia Pedra D’Água, ao lado de onde também “está plantado” o Cacique Xicão, Xico Quelé e outros Xukuru. Eles se encantaram, ”Vou para aldeia encantada”, assim diz um toré Xukuru. Edson Silva (CAp-CE/UFPE) Recife, 11/09/05

SEU GERCINO, UMA VIDA INTEIRA NA HISTÓRIA XUKURU DO ORORUBÁ

SEU GERCINO, UMA VIDA INTEIRA NA HISTÓRIA XUKURU DO ORORUBÁ Gercino Balbino da Silva, conhecido por “Seu Gercino”, faleceu aos 83 anos em junho de 2007. Nasceu em 1920 na Aldeia Cana Brava, uma das muitas localidades espalhadas pela Serra do Ororubá, nas terras dos Xukuru. Na época as terras do antigo aldeamento declarado extinto em fins do século XIX, estavam invadidas por fazendeiros criadores de gado e senhores de engenhos que produziam cachaça e rapadura. Os Xukuru eram chamados de caboclos, tendo assim suas identidades negadas e consequentemente o direito as suas terras. Muitas famílias indígenas foram perseguidas, expulsas se dispersaram pela região, foram para as periferias das cidades e capitais. Outras passaram a trabalhar em suas próprias terras tomadas pelos fazendeiros e donos de engenhos. Algumas resistiram em pequenas glebas de terras, os “sítios” na sua maioria em locais de difíceis acessos. Uma grande produção de leite no município de Pesqueira. Fartura para uns poucos, miséria para muitas famílias Xukuru. Uma época difícil rememorada por Seu Gercino. Época de muita fome, com muitas crianças mortas por desnutrição como demonstram os próprios dados oficiais nos arquivos da Prefeitura de Pesqueira. O menino Gercino foi um dos sobreviventes. Sem terras para plantar e viver, os pais de Seu Gercino foram morar em Sítio do Meio, também na Serra do Ororubá, com os avós do menino que trabalhavam “de alugado” para um fazendeiro local. Desde criança Gercino enfrentou uma vida dura. Com oito anos trabalhava no “cabo da enxada”. Trabalhar também “de alugado”, ganhando cinco tostões por dia. Metade da diária paga a um trabalhador adulto. Assim como as demais famílias indígenas na Serra do Ororubá, além do trabalho alugado os familiares de Seu Gercino eram moradores nas terras em mãos dos fazendeiros. Moravam “de favor” e plantavam roça: milho e feijão para a subsistência. Com o compromisso de plantar o capim para o gado do invasor. Muitas vezes, mal dava tempo para colheita, o milho ainda verde o fazendeiro soltava o gado que destruía a roça. Se reclamasse eram expulsos, sem direito algum, a casa derrubada e o terreno transformado em plantio de pasto para os bois. Na lógica capitalista os bois tinham valor no lugar das vidas humanas. Nos tempos em que seca atingia o Agreste e até a Serra do Ororubá, Seu Gercino acompanhou seus parentes índios xukurus que migraram para “o Sul”, como chamavam a Zona da Mata Sul de Pernambuco, para trabalhar nos canaviais, nas usinas de cana-de-açúcar. Na esperança de retornar trazendo um pouco de dinheiro para os familiares que ficaram como os mais idosos, mulheres, crianças, todos que não puderam ir. A viagem de ida era muito penosa. Feita a pé, com poucos víveres. Eram percorridos quilômetros de estradas em dois dias, pela caatinga seca até Caruaru e dali continuavam a caminhada pelas matas de Bonito até a região dos canaviais. Enfrentavam-se vários perigos, além dos ataques de animais, o risco de assaltos e emboscadas, principalmente no retorno quando se portava os valores ganhos no trabalho ás vezes de até quatro meses. Mas mesmo com toda exclusão imposta pelos fazendeiros, os Xukuru espremidos em seus pequenos sítios, como moradores ou trabalhando nas fazendas e nos engenhos, por meio dos mutirões, das festas e as novenas realizadas em vários locais na Serra do Ororubá, vivenciavam intensos laços e situações de solidariedade. Seu Gercino recordou que durante as novenas se começavam muitos namoros, futuros casamentos. Participante no Toré que foi sempre dançado anualmente na Vila de Cimbres, no dia 23 de junho nas festas de São João e em 2 de julho e nas de “Nossa Mãe Tamain”, para os católicos romanos Nossa Senhora das Montanhas. Com doze anos Seu Gercino recebeu a incumbência de substituir o antigo “Bacurau”, o guia na frente dos que dançam o Toré. Exerceu essa função com maestria, desenvoltura e beleza até ser impedido pela doença, pois mesmo com peso dos anos de idade, estava lá firme como o “Bacurau” durante o Toré após as reuniões e nas festas realizadas Vila. Seu Gercino esteve ao lado do Cacique Xicão, de quem recebia muita estima e consideração, nas mobilizações contemporâneas dos Xukuru em busca de seus direitos. Acompanhou Xicão nas muitas viagens dos xukurus ao Recife e a Brasília onde foram pressionar a FUNAI e os demais órgãos públicos, bem como realizar a articulação com aliados, parceiros da sociedade civil nas denúncias das perseguições, violências e assassinatos de lideranças Xukuru, nas reivindicações pela demarcação das terras indígenas. Ele viu a concretização do sonho tão esperado com a demarcação das terras, o que vem possibilitando a fartura, o vicejar da vida e a dignidade para o povo Xukuru. Seu Gercino, uma vida inteira na história Xukuru! Um octogenário, bastante doente, mas lúcido e muito ativo. Rememorava com vivacidade a história do povo Xukuru por meio das histórias de seus antepassados, da sua própria história de vida. Quanta sabedoria! Como outros idosos e idosas, sábios e sábias Xukuru que marcaram a história de seu povo. Partiu, se encantou, foi se encontrar na aldeia sagrada com tantos outros como Seu Cícero Pereira, Seu Herculano, Xicão, Xico Quelé... De onde estão com seus testemunhos em e de vida, iluminam a caminhada do povo Xukuru e por isso serão sempre lembrados e celebrados. Edson Silva (UFPE)

SÃO JOÃO/CAÔ: FESTA RELIGIOSA DOS XUKURU DO ORORUBÁ (PESQUEIRA-PE) - Artigo

SÃO JOÃO/CAÔ: FESTA RELIGIOSA DOS XUKURU DO ORORUBÁ (PESQUEIRA-PE) Edson Silva Mulheres, crianças, jovens e homens xukurus, muitas pessoas curiosas se concentram por volta da três horas da tarde do dia 23 de junho na Vila de Cimbres, povoado no município de Pesqueira, interior de Pernambuco: vai começar “a busca da lenha”. No ritual realizado anualmente, os Xukuru caminham até cerca de dois quilômetros na caatinga e retornam com pedaços de paus e galhos secos que serão organizados na grande fogueira a ser acesa no início da noite, defronte a Igreja de Nossa Senhora das Montanhas (para os Xukuru “Nossa Mãe Tamain”). A festa começara pela manhã com fogos de artifício e a banda de pífanos. Índios xukurus vindos das aldeias, foram chegando e se dirigindo ao Centro Social São Miguel. Vieram de caminhão, a pé ou a cavalo. Muitos trouxeram o “fardamento”: o saiote de fibras de caroá ou palha de côco que eles chamam “Tacó”. Além da barretina na cabeça, das braçadeiras, goleiras e tornozeleiras para dançarem o Toré. Uma dança coletiva que é iniciada ainda pela manhã no salão do Centro Social. O sino da Igreja anuncia a hora da “busca da lenha” da qual participam índios e não-índios. A procissão para recolher madeira parte da frente da Igreja seguindo a bandeira de São João que é segurada pelo Cacique e lideranças indígenas, tendo ao lado ainda a banda de pífanos. Para os Xukuru esse ritual possui um sentido religioso profundo. Faz parte de um compromisso que deve ser renovado a cada ano. Retornando ao centro da Vila de Cimbres, depois de dar uma volta no templo católico romano, as madeiras são depositadas defronte dele, para fazer a grande fogueira. No início da noite as fogueiras menores em frente às casas da Vila e também a grande fogueira comunitária defronte a Igreja estão acesas. Por volta das 19 horas começa a missa. Os Xukuru que se concentravam no Centro Social São Miguel seguem em fila indiana, juntamente com a banda de pífanos para dentro da Igreja, onde ocupam os bancos, as laterais e todos os cantos do templo. Finda a missa os Xukuru também em fila indiana seguindo o tocador do “Mibi” (a gaita) dão três voltas em torno da Igreja. Param defronte ao pátio do templo católico romano e dançam o Toré, dando várias voltas ziguezagueando em forma do “S” . Dão muitas vivas a “Seu João”, a “Mãe Tamain” (Nossa Senhora das Montanhas para os católicos romanos) e ao Pai Tupã. Voltam para o salão do Centro Social onde continuam dançando o Toré até perto de meia-noite, quando vão para um local nas proximidades da Vila onde está uma pedra plana chamada Laje do Conselho. Naquele local em silêncio ficam esperando os conselhos dos Encantados, dos antepassados falecidos. Ocorrem incorporações de espíritos dos Encantados, que se manifestam pelos incorporados falando aos presentes atentos. Dançam Toré em cima da Laje. Aquele que escorregar na laje morrerá durante o ano, assim dizem e acreditam. Depois desse ritual retornam ao Centro São Miguel onde dançam até as quatro da manhã. Já próximo ao amanhecer vão outra vez para frente da Igreja, dançam e dão voltas em torno do templo, encerrando suas obrigações. Dizem que no passado os índios mais idosos caminhavam descalços nas brasas da fogueira. A despedida é saudada com fogos. É dia quando os Xukuru começam a retornar para suas aldeias. Estarão de volta a Vila de Cimbres no dia dois de julho para a Festa de “Nossa Mãe Tamain”. Os Xukuru são contabilizados em quase 10.000 indivíduos moradores em 24 aldeias, incluindo a de Cimbres, por toda a Serra do Ororubá. Além disso, aproximadamente 200 famílias habitam no Bairro “Xukurus” e em outros bairros da cidade de Pesqueira. Onde hoje está a Vila de Cimbres foi um antigo aldeamento fundado em 1639 pelos missionários Oratorianos. A colonização daquela região foi iniciada com grandes fazendas de gado de senhores de engenho do litoral. Em 1879 atendendo os insistentes pedidos da Câmara Municipal, o Governo Imperial decretou a extinção do Aldeamento de Cimbres e as terras foram destinadas ao patrimônio do município e posteriormente repassadas para terceiros. Ao longo dos séculos as terras dos xukurus foram invadidas por fazendeiros, muitas famílias indígenas foram perseguidas, expulsas e até mortas. Outras passaram a trabalhar em suas próprias terras tomadas pelos fazendeiros. Algumas resistiram em pequenas glebas de terras, os “sítios” em locais de difíceis acessos. Os Xukuru eram chamados de caboclos, tendo assim suas identidades negadas e consequentemente o direito as suas terras. Apesar disso anualmente eles compareciam a Cimbres para realizarem seus rituais religiosos. Vários documentos oficiais e cronistas fizeram registros sobre os Xukuru na Serra do Ororubá ao longo dos séculos. Em 1910 foi fundado o Serviço e Proteção aos Índios/SPI. Assim como outros povos indígenas no Nordeste ao tomarem conhecimento da existência de um órgão federal fundado para prestar assistência aos índios, os Xukuru iniciaram uma mobilização para obterem o reconhecimento pelo Estado brasileiro. Nas memórias orais Xukuru, encontramos relatos dessa mobilização contemporânea pelo reconhecimento oficial. Três índios foram a pé ao Rio de Janeiro procurar Marechal Rondon o fundador do SPI. Com a ida ao Rio de Janeiro além do reconhecimento oficial, os Xukuru conquistaram o direito à instalação de um Posto do SPI em suas terras. Um passo político importante diante das perseguições dos fazendeiros invasores do território indígena. Mas o Posto do SPI na Serra do Ororubá ao contrário do que desejam os Xukuru não garantiu suas terras de volta. O órgão federal no máximo fazia assistencialismo com a distribuição de alimentos, roupas, remédios, etc. e mediava os conflitos entre os fazendeiros e os índios explorados pelos invasores de suas terras. A partir de fins dos anos 1980 após a participação na campanha da Constituinte, com a atuação marcante do Cacique “Xicão”, os Xukuru retomam a mobilização por seus direitos. Motivados pelas conquistas expressas na Constituição de 1988 e contando com o apoio de outros povos indígenas no Nordeste e de setores da sociedade civil, como o Conselho Indigenista Missionário/ CIMI, órgão da Igreja Católica/CNBB, os Xukuru iniciaram a retomada de seu território tradicional, reocupando áreas de várias fazendas até então nas mãos de posseiros. Ainda na mesma década os Xukuru escolheram se autodenominarem Xukuru do Ororubá, para não serem confundidos com os Xukuru-Kariri na sua maioria habitantes em Palmeira dos Índios/AL. Além de ser uma liderança carismática para o seu povo, a atuação do Cacique “Xicão” foi bastante significativa para o povo Xukuru. Sob sua liderança os Xukuru pressionaram os órgãos públicos pelo reconhecimento de seus direitos e a demarcação de suas terras. Sob sua liderança as áreas do território indígena foram retomadas das mãos dos fazendeiros, permitindo que os indígenas pudessem plantar e colher superando a miséria, a fome de anos e voltarem a ter dignidade. A atuação do Cacique “Xicão” provocou a ira dos fazendeiros, da oligarquia de Pesqueira formada por tradicionais invasores das terras Xukuru, financiadores de um pistoleiro que assassinou o Cacique em 20/05/1998. Nos anos seguintes outras lideranças Xukuru como “Xico Quelé” morto numa emboscada em 2001, foram também assassinadas. As práticas religiosas Xukuru foram perseguidas e proibidas pela polícia a mando dos fazendeiros. A dança do Toré, por ser um ritual coletivo em que os índios se juntavam e podiam discutir a situação de opressão em que viviam também foi impedida pelos fazendeiros. Os Xukuru faziam seus rituais às escondidas nas matas, pois eram acusados de macumbeiros, como relatam os mais velhos. Com a reconquista das suas terras, oficialmente demarcadas pelo Governo Federal em 2001, os Xukuru puderam exercer livremente seus seculares rituais religiosos. No culto a São João os cristãos católicos lembram à tradição bíblica do santo profeta que buscou a justiça e a verdade. A lembrança do seu nascimento é uma animada festividade popular anualmente celebrada com as fogueiras, com o fogo que ilumina e purifica. Os Xukuru chama-o “Seu São João” ou ainda “Senhor São João”. O santo é também chamado “Caô”, uma influência da presença africana com os escravizados negros na Serra do Ororubá. Em setembro os Xukuru celebram também a Festa de São Miguel, santo que nomeia o salão que abriga os índios quando eles vêm participar de reuniões e de festividades na Vila de Cimbres. São Miguel é o arcanjo que anunciou o nascimento Jesus, o primo de São João. São Miguel é sempre representado com uma espada simbolizando a Justiça. O mensageiro da justiça divina. Nessas festas religiosas os Xukuru se apropriaram dos santos católicos romanos e atribuíram a eles novos significados. A história, as vidas desses dois são relidas, rememoradas a partir dos horizontes e interesses da história Xukuru, da situação em que vivem os índios. São João e São Miguel foram incorporados aos cultos Xukuru como símbolos da justiça, diante das injustiças e perseguições contra os índios. Como símbolos de força, coragem e incentivo para os Xukuru se mobilizarem pelos seus direitos. Na festa de São João os Xukuru comparecem anualmente a Vila de Cimbres com seus adornos que são vestidos especialmente nesses momentos festivos. A Festa de São João além de ser uma expressão da cultura, por meio dos rituais religiosos, é antes de tudo uma forma de afirmação da identidade indígena Xukuru do Ororubá.

POVOS INDÍGENAS E ENSINO DE HISTÓRIA: subsídios para a abordagem da temática indígena em sala de aula - Artigo

POVOS INDÍGENAS E ENSINO DE HISTÓRIA: subsídios para a abordagem da temática indígena em sala de aula Edson Silva RESUMO Este texto discute as visões estereotipadas, os equívocos e os preconceitos que normalmente possuímos sobre os “índios”, propõe uma crítica a história tradicional, bem como a sugestão de subsídios para uma nova abordagem dos povos indígenas no Ensino de História. PALAVRAS – CHAVES Índio – História – Ensino de História O que sabemos sobre os índios no Brasil? A dúvida ou a resposta negativa a essa pergunta ainda é ouvida da imensa maioria da população, na escola e até mesmo na universidade. Porém, segundo os dados mais recentes, no Brasil existem 225 povos indígenas que falam 100 línguas distintas, contabilizando uma população com 550.438 indivíduos (Prezia; Hoornaert, 2000), que habitam todas as regiões do Brasil. Essa totalização não inclui os chamados índios isolados que vivem em algumas localidades da Região Norte. De acordo ainda com as mesmas estimativas oficiais, no Nordeste moram 59.481 índios, cerca de 19% da população indígena no país. O desconhecimento sobre a situação atual dos povos indígenas, está associado basicamente à imagem do índio que é tradicionalmente veiculada pela mídia: um índio genérico com um biotipo formado por características correspondentes aos indivíduos de povos nativos habitantes na Região Amazônica e no Xingu, com cabelos lisos, pinturas corporais e abundantes adereços de penas, nus, moradores das florestas, de culturas exóticas etc. Ou também imortalizados pela literatura romântica produzida no Século XIX, como nos livros de José de Alencar, onde são apresentados índios belos e ingênuos, ou valentes guerreiros e ameaçadores canibais, ou seja, “bárbaros, bons selvagens e heróis” (Silva, 1994). Já na Escola, de um modo geral, o índio é lembrado, afora o primeiro momento do “Descobrimento” em 1500, no início da Colonização e no rosário das datas comemorativas, no “Dia do Índio”, quando comumente as crianças das primeiras séries do Ensino Fundamental são enfeitadas a semelhança de indígenas que habitam os Estados Unidos, e estimuladas a reproduzirem seus gritos de guerra! Até recentemente nos estudos da História do Brasil, o lugar do índio era na “formação” da chamada nacionalidade brasileira. Depois de desaparecer nos textos dos livros didáticos, o índio voltaria a ser lembrado nos estudos da Literatura da época do Romantismo no Brasil. O “índio” até bem pouco tempo estudado na História do Brasil ou em Estudos Sociais era único, “Tupi-Guarani” em todas as “tribos”, morava em “ocas” e “tabas”, era antropófago, preguiçoso e existente apenas no Xingu ou em remotas regiões do Norte do país. A desinformação, os equívocos e os pré-conceitos que motivam a violência cultural contra os povos indígenas, resultam das idéias eurocêntricas de “civilização”, do etnocentrismo cultural e da concepção evolucionista da História, onde, no presente, os indígenas são classificados como “primitivos” possuidores de expressões culturais exóticas ou folclóricas ainda preservadas, mas que determinadas a serem engolidas pelo “progresso” da nossa sociedade capitalista. 500 anos, outras histórias: a história indígena. Como nos últimos anos os estudos históricos têm passado por uma ampla renovação, o lugar dos povos indígenas na História também está sendo revisto. O “Descobrimento” passou a ser discutido como resultado do processo de expansionismo europeu no século XVI, através da Colonização do chamado “Novo Mundo”, onde os muitos diferentes povos e culturas das consideradas “terras descobertas”, se confrontaram com o violento processo das invasões dos seus territórios e da imposição cultural do colonizador. Os atuais estudos sobre os povos indígenas têm revelado, além da antigüidade da presença desses povos, a grande diversidade e pluralidade das sociedades nativas encontradas pelos colonizadores. Tendo sido superado o etnocentrismo que condicionava as informações e referências anteriores, as pesquisas atuais vêm descobrindo a complexidade e a especificidade dos povos indígenas, seus projetos políticos, as relações decorrentes com a Colonização, as estratégias da resistência indígena, etc. A Colonização deixou de ser vista como um movimento único, linear, de puro e simplesmente extermínio dos povos considerados passivos, submissos, impotentes, mas sim como um complexo jogo de relações, embates, negociações e conflitos, desde a chegada dos primeiros europeus no século XVI até os dias atuais, onde povos foram exterminados, e outros elaboraram diferentes estratégias para existirem até os dias de hoje. O “desaparecimento” dos povos indígenas No século XIX, nas regiões mais antigas da colonização portuguesa a exemplo do Nordeste, agravam-se os conflitos entre as Câmaras Municipais, onde se encastelavam os vereadores latifundiários e fazendeiros contra os indígenas. O Estado Brasileiro favoreceu esses grandes proprietários, chefes políticos locais, que passaram a negar a presença indígena em terras dos antigos aldeamentos, com argumentos da ausência da pureza racial, afirmando que os índios estavam “confundidos com a massa da população” (Silva, 1996), solicitando a extinção dos aldeamentos como forma de resolver os tradicionais conflitos com as invasões dos territórios indígenas. Assumindo o discurso dos grandes proprietários, entre 1860 – 1880, o Governo Imperial decreta oficialmente a extinção dos aldeamentos em várias regiões do país. Pela legislação da época, as terras dos aldeamentos deveriam ser medidas, demarcadas e loteadas em tamanhos diferentes, destinados à parte das famílias indígenas existentes no local. Nesse processo, além de serem reconhecidas as posses em domínio dos grandes proprietários invasores, a lei previa ainda a remoção de famílias indígenas que ficassem fora da partilha dos lotes, para outras aldeias. No caso de Pernambuco, a semelhança de outros lugares, na documentação da época encontra-se diversos registros de indígenas reclamando que não receberam seus lotes a que tinham direito, ou que a medição favorecia o latifundiário invasor das terras dos aldeamentos. Denúncias de violências, pressões e espancamentos contra os índios, multiplicaram-se em documentos da época. Muitas famílias se dispersaram, sem terras, fugindo às perseguições, vagavam nas estradas ou eram empregadas como trabalhadoras nas fazendas e engenhos. Outras se deslocaram para locais de difícil acesso, onde sobreviveram e mantiveram vivas a consciência étnica e suas tradições. Oficialmente, eram tidos como “caboclos”, ou “remanescentes” de indígenas que tinham “desaparecidos”, como se referiam os livros e foi incorporado pelo senso comum. O ressurgimento dos povos indígenas No início do século XX, esses povos que oficialmente eram considerados “extintos”, mas que de fato existiam e resistiam, iniciam a mobilização contemporânea pelo reconhecimento étnico oficial e garantia mínima de terras para sobreviverem diante das constantes perseguições dos latifundiários. No Nordeste foram reconhecidos os Xukuru-Kariri em Alagoas, e em Pernambuco os Fulni-ô (Águas Belas), os Pankararu (Tacaratu), os Xukuru (Pesqueira), com a instalação de postos do Serviço de Proteção ao Índio – SPI, entre os anos de 1920 – 1950, em suas áreas indígenas. Com o “milagre brasileiro” na década de 1970 e o avanço dos projetos agro-industriais, as pressões sobre as terras indígenas aumentaram, tanto as dos grupos reconhecidos oficialmente como as dos grupos ainda não reconhecidos. Os povos indígenas no Nordeste, pressionam a FUNAI para obterem a garantia de seus direitos históricos, como está registrado por toda a partir da década de 1980 com o ressurgimento dos grupos étnicos como os Pitaguary, os Jenipapo-Canindé, os Tabajara no Ceará; os Pipipã em Pernambuco, os Kalancó e os Karuazu em Alagoas; os Tumbalalá e os Tupinambá na Bahia. Fenômeno que vem ocorrendo também na Região Norte e chamado de etnogênese pela reflexão antropológica atual. A participação nas mobilizações e na vitoriosa campanha da Constituinte e para a elaboração da Constituição Federal aprovada em 1988, onde pela primeira vez na História do Brasil o Estado brasileiro reconheceu os povos indígenas com seus costumes, tradições e a demarcação e garantia de suas terras, por um lado, fortaleceu as lutas e reivindicações dos direitos históricos desses povos, acirrando por outro lado, os antigos conflitos, as violências e mortes provocadas pelos invasores das áreas indígenas. Resistência indígena nos 500 anos das violências da coloniais Diante das reações indígenas às invasões de suas terras, as imposições coloniais, as diversas formas de violência contra os povos indígenas, são marcas nesses 500 anos de Colonização. Ao longo da História do Brasil, foram cometidas diversas formas de violências contra os povos indígenas. Desde guerras, doenças transmitidas pelos colonizadores que exterminaram aldeias inteiras, a escravidão, ameaças e perseguições, os preconceitos, a violência cultural etc. Ainda que pese a falta de um maior número de informações, em virtude de muitas aldeias indígenas estarem localizadas em regiões de difíceis comunicações, no período de janeiro a setembro de 2001, por exemplo, foram contabilizados vários casos de agressões físicas, com invasões de domicílios, abuso de autoridade, detenções ilegais, enfim diversas formas de violações dos direitos dos povos indígenas. Além disso, foram registradas 09 ameaças de morte, contra comunidades inteiras ou a indígenas, totalizando mais de três mil vítimas. Nesse período o CIMI (Conselho Indigenista Missionário/CNBB) registrou ainda nove casos de assassinatos de indígenas, totalizando 10 vítimas, onde pelo menos em dois casos (Xukuru/PE e Guarani-Kaiowá/MS), as mortes estão estritamente relacionadas a conflitos de terras. Nesses crimes estão envolvidos além de policiais militares, jagunços a mando de fazendeiros e até autoridades municipais como um vice-prefeito. (Lacerda, 2001:133-141). Nas áreas mais antigas da Colonização, como é o caso do Nordeste, nos conflitos provocados pelas invasões às terras das aldeias, nos últimos anos, vários índios foram assassinados, na “guerra” movida pelos grandes latifundiários para manterem seus privilégios no campo. Em muitas localidades, apesar dos povos indígenas serem reconhecidos pelo Estado, às terras indígenas não estão totalmente regularizada, e em todas elas ocorrem conflitos por causa de invasões por terceiros. Em todas as áreas indígenas predomina o clima de tensão, em umas mais que em outras, os conflitos fundiários são mais violentos onde já ocorreram mortes indígenas. Além disso, a grande maioria da população indígena, tanto no Nordeste como em outras áreas mais antigas da colonização, vive em estado de miséria. As precárias condições de vida em razão de boa parte das terras mais férteis estarem invadidas por fazendeiros, são agravadas em épocas de longas estiagens quando a seca, que provoca a migração de contingentes indígenas para os grandes centros humanos como São Paulo, aonde vão em busca de melhores oportunidades de vida, passando a habitarem em favelas das periferias, sujeitos a violências urbanas. Recebendo a assistência governamental de forma deficiente, constatam-se entre os povos indígenas no Nordeste, casos de tuberculose e doenças de chagas em adultos. A desidratação e a desnutrição são as principais causas da mortalidade infantil em Pernambuco (Jornal do Commercio, 1995, 2-3). No ano de 1997, o Brasil ficou marcado pelo cruel assassinato do índio Galdino Pataxó, morto queimado, enquanto dormia em um banco numa parada de ônibus, no “Dia do Índio”, em Brasília, onde tinha ido cobrar das autoridades providências para a demarcação das terras do seu povo no Sul da Bahia. Vítima de “uma brincadeira” de 4 adolescentes da classe média do Distrito Federal que jogaram combustível e atearam fogo no corpo de Galdino. O ato brutal de violência colocou outra vez em debate as questões dos direitos, os preconceitos e as omissões da política indigenista do Governo diante das agressões contra os povos indígenas no país. Se o país escandalizou-se com a crueldade do assassinato de Galdino Pataxó, outro assassinato em tempos mais recentes provocou grandes repercussões no Brasil e no exterior. Em 20 de maio de 1998, Francisco de Assis Araújo, o Cacique “Xicão” foi assassinado em Pesqueira, com 6 tiros por um desconhecido que fugiu. Xicão tornara-se, nos últimos anos, uma expressiva liderança do povo Xukuru nas exigências para demarcação das terras do seu povo, nas lutas pelas conquistas e garantias dos direitos indígenas. Reconhecido também pela liderança na organização dos povos indígenas no Nordeste e no movimento indígena no Brasil. Xicão, há mais de 10 anos, recebia ameaças de morte, denunciadas às autoridades públicas, tendo escapado de diversas emboscadas e tentativas de assassinato, cujos suspeitos são os fazendeiros invasores na área indígena, contrários à demarcação das terras Xukuru. A impunidade dos mandantes e executores dos crimes favorecem as continuadas violências contra os povos indígenas. As omissões do Governo Brasileiro em garantir, como prevista em lei, a proteção aos indígenas e ao seu patrimônio, a vagareza nas apurações e condenações da Justiça que, quando consegue concluir um processo, o julgamento de um acusado demora anos, sendo ele comumente absolvido. Uma realidade inconcebível confrontada com o marketing dos discursos políticos oficiais sobre soluções para a questão indígena no país. O Brasil comemorou no final de 1998, os 50 Anos da Declaração Universal Direitos Humanos da qual o país é signatário. Além disso, os governantes patrocinaram os festejos triunfalistas dos 500 anos da Colonização em abril/2000, quando em Porto Seguro na Bahia, a polícia reprimiu com vigor onde muitos ficaram feridos – o que foi mostrado pelos meios de comunicação – uma pacífica manifestação dos povos indígenas contrários às comemorações oficiais. Cabe então a pergunta que debatiam teólogos e juristas espanhóis no início da Colonização, no século XVI: e os índios são humanos? Nos últimos anos, os povos indígenas no Nordeste, assim como em todo o Brasil fortaleceram suas organizações, intensificaram as mobilizações pelo reconhecimento étnico enquanto povos diferenciados, pela demarcação e retirada dos invasores de suas terras, pelas conquistas e garantia dos seus direitos a uma assistência de saúde e educação diferenciadas, ocupando um inegável lugar no cenário político, obrigando-nos a rever a História, superar equívocos, preconceitos e omissões e a tradicional idéia errônea de uma homogeneidade cultural no Brasil. Superando equívocos, preconceitos e omissões: propostas. para abordar a temática indígena na escola A seguir estão elencadas sugestões a serem discutidas e implementadas no âmbito da escola, no sentido de contribuir de forma efetiva com o fim dos equívocos, preconceitos e omissões sobre a temática indígena. Essas propostas devem estar baseadas antes de tudo nos esforços do conhecimento da situação em que vivem e a superação de toda e qualquer forma de discriminações contra os povos indígenas, bem como e pelo reconhecimento de seus direitos históricos: • Incluir a temática indígena nas capacitações, estudos e treinamentos periódicos do professorado, a ser abordada na perspectiva da pluralidade cultural historicamente existente no Brasil e na sociedade em que vivemos. • Estimular o conhecimento sobre os povos indígenas, através de cursos, seminários, encontros de estudos específicos e interdisciplinares destinados ao professorado e demais trabalhadores/as em educação na escola, com assessoria de especialistas. • Intensificar a produção, com assessoria de pesquisadores/as especialistas, de vídeos, cartilhas, subsídios didáticos sobre os povos indígenas para serem utilizados em sala de aula. • Promover estudos específicos para que o professorado de História possa conhecer os povos indígenas no Brasil, possibilitando uma melhor abordagem ao tratar da temática indígena em sala de aula, particularmente nos municípios onde atualmente habitam povos indígenas. • Estimular e apoiar professores/as que possuam interesses em aprofundar através de Cursos de Pós-Graduação os estudos sobre os povos indígenas. • Promover momentos de intercâmbios entre os povos indígenas e as escolas durante o calendário letivo, através de visitas previamente preparadas do alunado às aldeias, bem como de indígenas às escolas. IMPORTANTE: ação a ser desenvolvida principalmente nos municípios onde atualmente moram os povos indígenas, como forma de buscar a superação dos preconceitos e as discriminações. • Ampliar o “Dia do Índio” para uma “Semana dos Povos Indígenas” a ser promovida nas escolas com exposições de trabalhos e pesquisas interdisciplinares realizadas pelo alunado, exibição de vídeos, fotografias, debates com a participação de indígenas, especialistas, instituições indigenistas, etc., como forma de proporcionar maior conhecimento sobre a situação e diversidade sociocultural dos povos indígenas. • Proporcionar o acesso a publicações: livros, periódicos, etc., como fonte de informação e pesquisa sobre os povos indígenas. • Discutir e propor o apoio aos povos indígenas, através do estímulo ao alunado, com a realização de abaixo-assinados, cartas às autoridades com denúncias e exigências de providências para as violências contra os povos indígenas, assassinatos de suas lideranças, etc. • Estimular através de manifestações coletivas na sala de aula, o apoio às campanhas de demarcação das terras e garantia dos direitos dos povos indígenas. • Enfim, promover ações pautadas na perspectiva da diversidade cultural e dos direitos dos povos indígenas, bem como do reconhecimento de que o Brasil é um país pluricultural e pluriétnico. ANEXO I Estudando os povos indígenas: leituras básicas mínimas e outras fontes LIVROS • BRUIT, Héctor H. Bartolomé de Las Casas e a simulação dos vencidos. São Paulo: Unicamp, 1995. • CIMI (Conselho Indigenista Missionário). Outros 500: construindo uma nova história. São Paulo: Salesiana, 2001. • CUNHA, Manuela Carneiro da. (Org.). História dos índios no Brasil. 2a ed. São Paulo: Cia. das Letras. 1998. • GOMES, Mércio. Os índios e o Brasil. Petrópolis: Vozes, 1985. • GRUPIONI, Luís Donizete Benzi. (Org.). Índios no Brasil. Brasília: MEC, 1994. (existe outra edição por uma editora comercial). • MARTIN, Gabriela. Pré-História do Nordeste do Brasil. 3a ed.rev. e atual. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2000. • MEC. Índios no Brasil. Cadernos da TV Escola. Brasília, 1999. (Vols. 1,2 e 3). • MELATTI, Júlio César. Índios do Brasil. 7a ed. São Paulo: Hucitec, 1987. • MONTEIRO, John M. Negros da terra: índios e bandeirantes nas origens de São Paulo. São Paulo: Cia. das Letras, 1994. • OLIVEIRA, João Pacheco de. (Org.). A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no Nordeste indígena. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1999. • PREZIA, Bendito; HOORNAERT, Eduardo. Brasil indígena: 500 anos de resistência. São Paulo: FTD, 2000. • RICARDO, Carlos Alberto. (Ed.). Povos indígenas no Brasil 1996-2000. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2001. • SILVA, Aracy Lopes da; GRUPIONI, Luís Donizete Benzi. (Orgs.). A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1 e 2 graus. Brasília: Mari/Unicef/Unesco, 1995. SILVA, Aracy Lopes da; FERREIRA, Maria Kawall Leal. (Orgs.). Antropologia, História e Educação: a questão indígena e a escola. São Paulo: Global Editora/Fapesp/Mari-USP, 2001. JORNAIS • PORANTIM. Brasília, Conselho Indigenista Missionário-CIMI/CNBB. www.cimi.org.br • TUPARI. Cuiabá, Grupo de Trabalho Missionário Evangélico-GTME. E-mail: gtme@zaz.com.br • MENSAGEIRO. Belém, CIMI-Norte I. E-mail: cimiblm@amazon.com.br FILMES (disponíveis em locadoras) •Rapa-Nui (120 minutos) •Avaeté, semente de vingança (90 minutos). Ameríndia (70 minutos) •Xingu (90 minutos) Dança com os lobos (180 minutos) Gerônimo (100 Minutos) •Filho da estrela nascente (180 minutos) •Pequeno grande homem (100 minutos) • Aguirre, a cólera dos deuses (100 minutos) Hábito negro (93 minutos) • República Guarani (100 minutos) A missão (100 minutos) Brincando nos campos do senhor (180 minutos) • !492, o Descobrimento da América (120 minutos). Cristóvão Colombo: a aventura do Descobrimento (100 minutos) • Coração de trovão (115 minutos) •Espírito guerreiro (93 minutos) OBS.: vê na página do CIMI www.cimi.org.br outros endereços na Internet sobre os povos indígenas. ANEXO II Um roteiro para o estudo dos povos indígenas no Ensino de História 1. Os povos indígenas no Brasil atual: uma opção teórica-metodológica: iniciar o estudo a partir do conhecimento sobre a atual situação dos povos indígenas existentes no país. Utilizar mapas, quadros com a localização e distribuição pelas Regiões dos povos indígenas no Brasil. 2. A diversidade indígena no Brasil: enfocar a atual diversidade sociocultural dos povos indígenas no Brasil; estudar enfocando a diversidade histórica do Brasil indígena, nos períodos anterior e logo após o início da colonização em 1500, superando a tradicional e simplista dicotomia de “tupi x tapuia”. Utilizar fotografias para demonstrar a diversidade dos povos indígenas no Brasil. 3. A antigüidade da presença indígena no Brasil: discutir as teorias do povoamento da América e no Brasil, enfatizando as descobertas mais recentes das pesquisas arqueológicas realizadas em São Raimundo Nonato-PI. Estudar os diferentes grupos humanos, os antepassados dos atuais povos indígenas no Brasil. 4. A história indígena no Brasil, uma história de resistência: estudar as permanentes e diferentes estratégias de resistência indígena na História do Brasil, superando as visões da colonização como tragédia histórica com uma suposta assimilação, a integração e o “desaparecimento” dos povos indígenas. Estudar o fenômeno do ressurgimento de povos indígenas nas áreas mais antigas da colonização portuguesa no Brasil. 5. 500 anos, qual o significado? Discutir o sentido dos 500 anos na História do Brasil, do ponto de vista oficial e do ponto de vista indígena de resistência à colonização, com as reivindicações para o reconhecimento e garantias de seus direitos violados. BIBLIOGRAFIA ATLAS DAS TERRAS INDÍGENAS DO NORDESTE. Rio de Janeiro: PETI, PPGAS/Museu Nacional/UFRJ, 1993. BRASIL. FUNAI. Sociedades indígenas e ação do Governo. Brasília: 1996. CIMI – Conselho Indigenista Missionário. A violência contra os povos indígenas no Brasil. Brasília: CIMI/CNBB, 1997. INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Povos indígenas no Brasil: 1961-2000. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2000. LACERDA, Rosane F. Mais pedras no caminho dos povos indígenas para outros 500. In, DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 2001/Relatório da Rede Social de Justiça e Diretos Humanos em parceria com Global Exchange. São Paulo, dezembro de 2001, pp.129-141. PREZIA, Benedito; HOORNAERT, Eduardo. Brasil indígena: 500 anos de resistência. São Paulo: FTD, 2000. SANTILLI, Márcio. Os brasileiros e os índios. São Paulo: SENAC, 2000. SILVA, Edson. Bárbaros, bons selvagens, heróis: imagens de índios no Brasil. In, CLIO – Revista de Pesquisa Histórica da Universidade Federal de Pernambuco (Série História do Nordeste n.º15). Recife: Editora Universitária, 1994, pp.53-71. _ _ _ _ _ . Povos indígenas, violência e educação. In Cadernos da Extensão n. 2, jun../99. Recife: Pró – Reitoria de Extensão da UFPE, 1999, pp.111-117. _ _ _ _ _ . Resistência indígena nos 500 anos de Colonização. In, BRANDÃO, Silvana. (Org.). Brasil 500 anos: reflexões. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2000, pp.99-129.