AQUI E AGORA TEM

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Bem - Vindos !

CONCURSO PÚBLICO - www.upenet.com.br

Olinda vai contratar 344 novos servidores.Há vagas para médicos, agentes de trânsito e professores. Salários vão de R$545 a R$7.716 . Inscrição começa hoje e segue até 13 de março. Fonte: JC - Cidades de 16 de Fevereiro 2011

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

XICÃO XUKURU: “Ele foi plantado para que dele nasça novos guerreiros”

(para Jornal Igreja Nova. Recife, abril, 2005). XICÃO XUKURU: “Ele foi plantado para que dele nasça novos guerreiros” O dia 20 de maio é de luto para o povo Xukuru do Ororubá em Pesqueira. Era uma quarta-feira, um dia como outro qualquer da feira semanal na cidade, momento em que os índios xukurus descem de suas aldeias na Serra do Ororubá para comercializar seus produtos, comprar os gêneros que necessitam, resolver alguma pendência, etc. Nesse dia em 1998, quando o Cacique Xicão estacionava o carro na frente da casa de sua irmã, no Bairro Xukurus, um estranho se aproximou e a queima roupa disparou vários tiros assassinando o Cacique ainda dentro do veículo, fugindo o pistoleiro em seguida. Com o Cacique Xicão, o povo Xukuru a partir dos anos 1980 retomou a mobilização por suas terras secularmente invadidas por fazendeiros. Após a participação na campanha da Assembléia Nacional Constituinte, com a expressiva liderança e atuação do Cacique, motivados pelas conquistas na Constituição de 1988, os Xukuru articulados com setores da sociedade civil, como o CIMI (Conselho Indigenista Missionário, órgão anexo à CNBB), iniciaram a retomada de seu território tradicional, reocupando áreas de várias fazendas. A liderança de Xicão atraiu a ira dos fazendeiros, muitos deles membros da oligarquia de Pesqueira. Ele passou a receber várias ameaças de morte. Mesmo após o brutal assassinato de Xicão e posteriormente do líder Chico Quelé em agosto/2001, embora bastante abalado, o povo Xukuru continuou por meio da articulação interna, o processo de organização e mobilização pela conquista de seus direitos, de suas terras hoje reocupadas em cerca de 85%. Por essa razão, o 20 de maio é também um dia de reconhecimento e afirmação indígena, de protesto em memória do Cacique Xicão, pela impunidade das violências contra os povos indígenas e suas lideranças. Nesse sentido, anualmente ocorre a Assembléia do povo Xukuru quando são discutidos os problemas e elegidas as prioridades de trabalho para os próximos meses. Após um ato religioso no centro da mata na Aldeia Pedra D’ Água, local em que Xicão foi “plantado”, é realizada uma grande caminhada, com a participação massiva dos Xukuru, além de indígenas de outras delegações de várias partes do Brasil, aliados e muitas pessoas solidárias com os povos indígenas, que descem da Serra do Ororubá, passam pelas ruas centrais de Pesqueira e vão até o local onde Xicão foi assassinado, onde um multidão fazem um ato público em sua memória. A leitura da trajetória de atuação do Cacique Xicão nos faz lembrar de outras lideranças, a exemplo de Margarida Maria Alves, camponesa, líder sindical em Alagoa Grande/PB, assassinada a mando de fazendeiros nos anos de 1980, que afirmava “morro, mas não fujo da luta!”. Como Santos Dias, líder operário, assassinado pela polícia, na mesma época, durante uma greve dos metalúrgicos em São Paulo, e de tantas outras lideranças mortas na defesa de uma sociedade plural, de igualdade, justiça e dignidade para todos/as. A persistência do Cacique Xicão, de Chico Quelé, o empenho, a luta, suas vidas e de tantos outros/as que lutaram pelo reconhecimento dos direitos indígenas, da justiça e vida plena, não foi em vão: “Do sangue de Margarida, margaridas!” e como dizem os Xukuru sobre Xicão, “ele não foi enterrado, ele foi plantado, para que dele nasça novos guerreiros!”. Somos chamados/as para testemunhar a concretização dessas afirmações no próximo dia 20 de maio indo a Pesqueira. ____________________________ Edson Silva é professor no Col. de Aplicação/CENTRO DE EDUCAÇÃO-UFPE. E-mail: edson.edsilva@gmail.com

XUKURU DO ORORUBÁ: OS VELHOS NÃO MORREM, SE ENCANTAM...

(publicado in Jornal Porantim. Brasília, CIMI/DF, nº. 279,outubro 2005, p.7). XUKURU DO ORORUBÁ: OS VELHOS NÃO MORREM, SE ENCANTAM... No povo Xukuru do Ororubá (Pesqueira/PE) desde muito tempo, antes do escritor Guimarães Rosa ter descoberto, os Xukuru acreditam: dois importantes idosos para a história desse povo partiram para o “reino dos Encantados”. Um deles “Seu” Herculano, respeitado pela sua sabedoria, acompanhante do Cacique “Xicão”, moradores da Aldeia Pedra D’Água, desde o início participou das mobilizações contemporâneas que garantiram a demarcação das terras desse povo. A outra importante referência “Seu” Cícero Pereira, foi o pai do Cacique Xicão, assassinado a mando de fazendeiros invasores do território indígena, e avô do atual Cacique Marcos. Possuidor de uma memória prodigiosa, “Seu” Cícero em várias conversas lembrava com muitos detalhes do passado Xukuru, dos tempos difíceis com as perseguições dos fazendeiros. Nascido na Aldeia Cana Brava, ou “Cana Braba”, como ainda hoje chamam os/as mais idosos/as e de onde provém a linhagem do cacicado Xukuru do Ororubá, “Seu Ciço” como era conhecido, filho de uma família numerosa, recordava que desde a infância, assim como muitas crianças da sua época, tinha que trabalhar duro na roça, no pequeno pedaço de terra que possuía, quando não nas terras das fazendas que ocupavam o território Xukuru. “Seu Ciço” falava também das “juntadas”, reunião daqueles moradores que possuíam pequenos lotes, para trabalharem em mutirões de ajuda mútua. Lembrava que quando garoto desceu tantas vezes a Serra do Ororubá em um cavalo com os caçoás carregados de verduras, milho e produtos da roça que vendia na estação do trem em Pesqueira. Mas, como a vida não era só trabalho, recordava também e tão bem com alegria das novenas, das festas animadas ao som das zabumbas, onde além da diversão garantida, se acertava os noivados, futuros casamentos. Ele teve um papel fundamental nas mobilizações contemporâneas dos Xukuru do Ororubá. Quando os Xukuru se organizam em meados de 1980, elegendo o Cacique Xicão, reconhecida e expressiva liderança desse povo com projeção ao nível do país, “Seu Ciço” foi eleito Vice-Cacique. Sua atuação sempre foi discreta, mas garantiu o apoio necessário, muitas vezes também material, para a atuação de Xicão e a organização indígena Xukuru. Por isso ele sempre foi visto como uma importante referência na luta desse povo. Muito abalado e magoado desde o assassinato do Cacique Xicão, doente ele se viu forçado a deixar a aldeia e vir morar na cidade. Mas em sua casa a todos/as recebia com satisfação e sempre disposto a uma longa conversa sobre o passado, a memória Xukuru e por isso era uma grande referência. Vibrava com as conquistas do presente do seu povo e colocava muita esperança no futuro, falando com orgulho da liderança exercida pelo atual jovem Cacique Marcos, seu neto. As partidas de “Seu” Herculano e de “Seu” Cícero nos questionam sobre o que pensamos a respeito das pessoas mais velhas. Como são vistos os/as mais velhos/as nas aldeias? Qual o lugar dos/as idosos/as entre os povos indígenas? Em um mundo onde o/a velho/a, principalmente os/as pobres, em oposição ao novo, ao moderno são descartados, desprezados, vivem na imensa maioria em péssimas condições, a vida, a história, a experiência, o testemunho e a sabedoria de “Seu” Herculano, de “Seu” Cícero, de tantos idosos/as, além de nos questionar, nos lembra que somos sombras do passado e do qual esboçamos o futuro. Talvez por isso os Xukuru do Ororubá afirmem que não enterram, mas “plantam” seus mortos, para que deles “nasçam novos guerreiros”. E “Seu” Herculano e “Seu” Cícero foram plantados ali, no meio da mata sagrada da Aldeia Pedra D’Água, ao lado de onde também “está plantado” o Cacique Xicão, Xico Quelé e outros Xukuru. Eles se encantaram, ”Vou para aldeia encantada”, assim diz um toré Xukuru. Edson Silva (CAp-CE/UFPE) Recife, 11/09/05

SEU GERCINO, UMA VIDA INTEIRA NA HISTÓRIA XUKURU DO ORORUBÁ

SEU GERCINO, UMA VIDA INTEIRA NA HISTÓRIA XUKURU DO ORORUBÁ Gercino Balbino da Silva, conhecido por “Seu Gercino”, faleceu aos 83 anos em junho de 2007. Nasceu em 1920 na Aldeia Cana Brava, uma das muitas localidades espalhadas pela Serra do Ororubá, nas terras dos Xukuru. Na época as terras do antigo aldeamento declarado extinto em fins do século XIX, estavam invadidas por fazendeiros criadores de gado e senhores de engenhos que produziam cachaça e rapadura. Os Xukuru eram chamados de caboclos, tendo assim suas identidades negadas e consequentemente o direito as suas terras. Muitas famílias indígenas foram perseguidas, expulsas se dispersaram pela região, foram para as periferias das cidades e capitais. Outras passaram a trabalhar em suas próprias terras tomadas pelos fazendeiros e donos de engenhos. Algumas resistiram em pequenas glebas de terras, os “sítios” na sua maioria em locais de difíceis acessos. Uma grande produção de leite no município de Pesqueira. Fartura para uns poucos, miséria para muitas famílias Xukuru. Uma época difícil rememorada por Seu Gercino. Época de muita fome, com muitas crianças mortas por desnutrição como demonstram os próprios dados oficiais nos arquivos da Prefeitura de Pesqueira. O menino Gercino foi um dos sobreviventes. Sem terras para plantar e viver, os pais de Seu Gercino foram morar em Sítio do Meio, também na Serra do Ororubá, com os avós do menino que trabalhavam “de alugado” para um fazendeiro local. Desde criança Gercino enfrentou uma vida dura. Com oito anos trabalhava no “cabo da enxada”. Trabalhar também “de alugado”, ganhando cinco tostões por dia. Metade da diária paga a um trabalhador adulto. Assim como as demais famílias indígenas na Serra do Ororubá, além do trabalho alugado os familiares de Seu Gercino eram moradores nas terras em mãos dos fazendeiros. Moravam “de favor” e plantavam roça: milho e feijão para a subsistência. Com o compromisso de plantar o capim para o gado do invasor. Muitas vezes, mal dava tempo para colheita, o milho ainda verde o fazendeiro soltava o gado que destruía a roça. Se reclamasse eram expulsos, sem direito algum, a casa derrubada e o terreno transformado em plantio de pasto para os bois. Na lógica capitalista os bois tinham valor no lugar das vidas humanas. Nos tempos em que seca atingia o Agreste e até a Serra do Ororubá, Seu Gercino acompanhou seus parentes índios xukurus que migraram para “o Sul”, como chamavam a Zona da Mata Sul de Pernambuco, para trabalhar nos canaviais, nas usinas de cana-de-açúcar. Na esperança de retornar trazendo um pouco de dinheiro para os familiares que ficaram como os mais idosos, mulheres, crianças, todos que não puderam ir. A viagem de ida era muito penosa. Feita a pé, com poucos víveres. Eram percorridos quilômetros de estradas em dois dias, pela caatinga seca até Caruaru e dali continuavam a caminhada pelas matas de Bonito até a região dos canaviais. Enfrentavam-se vários perigos, além dos ataques de animais, o risco de assaltos e emboscadas, principalmente no retorno quando se portava os valores ganhos no trabalho ás vezes de até quatro meses. Mas mesmo com toda exclusão imposta pelos fazendeiros, os Xukuru espremidos em seus pequenos sítios, como moradores ou trabalhando nas fazendas e nos engenhos, por meio dos mutirões, das festas e as novenas realizadas em vários locais na Serra do Ororubá, vivenciavam intensos laços e situações de solidariedade. Seu Gercino recordou que durante as novenas se começavam muitos namoros, futuros casamentos. Participante no Toré que foi sempre dançado anualmente na Vila de Cimbres, no dia 23 de junho nas festas de São João e em 2 de julho e nas de “Nossa Mãe Tamain”, para os católicos romanos Nossa Senhora das Montanhas. Com doze anos Seu Gercino recebeu a incumbência de substituir o antigo “Bacurau”, o guia na frente dos que dançam o Toré. Exerceu essa função com maestria, desenvoltura e beleza até ser impedido pela doença, pois mesmo com peso dos anos de idade, estava lá firme como o “Bacurau” durante o Toré após as reuniões e nas festas realizadas Vila. Seu Gercino esteve ao lado do Cacique Xicão, de quem recebia muita estima e consideração, nas mobilizações contemporâneas dos Xukuru em busca de seus direitos. Acompanhou Xicão nas muitas viagens dos xukurus ao Recife e a Brasília onde foram pressionar a FUNAI e os demais órgãos públicos, bem como realizar a articulação com aliados, parceiros da sociedade civil nas denúncias das perseguições, violências e assassinatos de lideranças Xukuru, nas reivindicações pela demarcação das terras indígenas. Ele viu a concretização do sonho tão esperado com a demarcação das terras, o que vem possibilitando a fartura, o vicejar da vida e a dignidade para o povo Xukuru. Seu Gercino, uma vida inteira na história Xukuru! Um octogenário, bastante doente, mas lúcido e muito ativo. Rememorava com vivacidade a história do povo Xukuru por meio das histórias de seus antepassados, da sua própria história de vida. Quanta sabedoria! Como outros idosos e idosas, sábios e sábias Xukuru que marcaram a história de seu povo. Partiu, se encantou, foi se encontrar na aldeia sagrada com tantos outros como Seu Cícero Pereira, Seu Herculano, Xicão, Xico Quelé... De onde estão com seus testemunhos em e de vida, iluminam a caminhada do povo Xukuru e por isso serão sempre lembrados e celebrados. Edson Silva (UFPE)

SÃO JOÃO/CAÔ: FESTA RELIGIOSA DOS XUKURU DO ORORUBÁ (PESQUEIRA-PE) - Artigo

SÃO JOÃO/CAÔ: FESTA RELIGIOSA DOS XUKURU DO ORORUBÁ (PESQUEIRA-PE) Edson Silva Mulheres, crianças, jovens e homens xukurus, muitas pessoas curiosas se concentram por volta da três horas da tarde do dia 23 de junho na Vila de Cimbres, povoado no município de Pesqueira, interior de Pernambuco: vai começar “a busca da lenha”. No ritual realizado anualmente, os Xukuru caminham até cerca de dois quilômetros na caatinga e retornam com pedaços de paus e galhos secos que serão organizados na grande fogueira a ser acesa no início da noite, defronte a Igreja de Nossa Senhora das Montanhas (para os Xukuru “Nossa Mãe Tamain”). A festa começara pela manhã com fogos de artifício e a banda de pífanos. Índios xukurus vindos das aldeias, foram chegando e se dirigindo ao Centro Social São Miguel. Vieram de caminhão, a pé ou a cavalo. Muitos trouxeram o “fardamento”: o saiote de fibras de caroá ou palha de côco que eles chamam “Tacó”. Além da barretina na cabeça, das braçadeiras, goleiras e tornozeleiras para dançarem o Toré. Uma dança coletiva que é iniciada ainda pela manhã no salão do Centro Social. O sino da Igreja anuncia a hora da “busca da lenha” da qual participam índios e não-índios. A procissão para recolher madeira parte da frente da Igreja seguindo a bandeira de São João que é segurada pelo Cacique e lideranças indígenas, tendo ao lado ainda a banda de pífanos. Para os Xukuru esse ritual possui um sentido religioso profundo. Faz parte de um compromisso que deve ser renovado a cada ano. Retornando ao centro da Vila de Cimbres, depois de dar uma volta no templo católico romano, as madeiras são depositadas defronte dele, para fazer a grande fogueira. No início da noite as fogueiras menores em frente às casas da Vila e também a grande fogueira comunitária defronte a Igreja estão acesas. Por volta das 19 horas começa a missa. Os Xukuru que se concentravam no Centro Social São Miguel seguem em fila indiana, juntamente com a banda de pífanos para dentro da Igreja, onde ocupam os bancos, as laterais e todos os cantos do templo. Finda a missa os Xukuru também em fila indiana seguindo o tocador do “Mibi” (a gaita) dão três voltas em torno da Igreja. Param defronte ao pátio do templo católico romano e dançam o Toré, dando várias voltas ziguezagueando em forma do “S” . Dão muitas vivas a “Seu João”, a “Mãe Tamain” (Nossa Senhora das Montanhas para os católicos romanos) e ao Pai Tupã. Voltam para o salão do Centro Social onde continuam dançando o Toré até perto de meia-noite, quando vão para um local nas proximidades da Vila onde está uma pedra plana chamada Laje do Conselho. Naquele local em silêncio ficam esperando os conselhos dos Encantados, dos antepassados falecidos. Ocorrem incorporações de espíritos dos Encantados, que se manifestam pelos incorporados falando aos presentes atentos. Dançam Toré em cima da Laje. Aquele que escorregar na laje morrerá durante o ano, assim dizem e acreditam. Depois desse ritual retornam ao Centro São Miguel onde dançam até as quatro da manhã. Já próximo ao amanhecer vão outra vez para frente da Igreja, dançam e dão voltas em torno do templo, encerrando suas obrigações. Dizem que no passado os índios mais idosos caminhavam descalços nas brasas da fogueira. A despedida é saudada com fogos. É dia quando os Xukuru começam a retornar para suas aldeias. Estarão de volta a Vila de Cimbres no dia dois de julho para a Festa de “Nossa Mãe Tamain”. Os Xukuru são contabilizados em quase 10.000 indivíduos moradores em 24 aldeias, incluindo a de Cimbres, por toda a Serra do Ororubá. Além disso, aproximadamente 200 famílias habitam no Bairro “Xukurus” e em outros bairros da cidade de Pesqueira. Onde hoje está a Vila de Cimbres foi um antigo aldeamento fundado em 1639 pelos missionários Oratorianos. A colonização daquela região foi iniciada com grandes fazendas de gado de senhores de engenho do litoral. Em 1879 atendendo os insistentes pedidos da Câmara Municipal, o Governo Imperial decretou a extinção do Aldeamento de Cimbres e as terras foram destinadas ao patrimônio do município e posteriormente repassadas para terceiros. Ao longo dos séculos as terras dos xukurus foram invadidas por fazendeiros, muitas famílias indígenas foram perseguidas, expulsas e até mortas. Outras passaram a trabalhar em suas próprias terras tomadas pelos fazendeiros. Algumas resistiram em pequenas glebas de terras, os “sítios” em locais de difíceis acessos. Os Xukuru eram chamados de caboclos, tendo assim suas identidades negadas e consequentemente o direito as suas terras. Apesar disso anualmente eles compareciam a Cimbres para realizarem seus rituais religiosos. Vários documentos oficiais e cronistas fizeram registros sobre os Xukuru na Serra do Ororubá ao longo dos séculos. Em 1910 foi fundado o Serviço e Proteção aos Índios/SPI. Assim como outros povos indígenas no Nordeste ao tomarem conhecimento da existência de um órgão federal fundado para prestar assistência aos índios, os Xukuru iniciaram uma mobilização para obterem o reconhecimento pelo Estado brasileiro. Nas memórias orais Xukuru, encontramos relatos dessa mobilização contemporânea pelo reconhecimento oficial. Três índios foram a pé ao Rio de Janeiro procurar Marechal Rondon o fundador do SPI. Com a ida ao Rio de Janeiro além do reconhecimento oficial, os Xukuru conquistaram o direito à instalação de um Posto do SPI em suas terras. Um passo político importante diante das perseguições dos fazendeiros invasores do território indígena. Mas o Posto do SPI na Serra do Ororubá ao contrário do que desejam os Xukuru não garantiu suas terras de volta. O órgão federal no máximo fazia assistencialismo com a distribuição de alimentos, roupas, remédios, etc. e mediava os conflitos entre os fazendeiros e os índios explorados pelos invasores de suas terras. A partir de fins dos anos 1980 após a participação na campanha da Constituinte, com a atuação marcante do Cacique “Xicão”, os Xukuru retomam a mobilização por seus direitos. Motivados pelas conquistas expressas na Constituição de 1988 e contando com o apoio de outros povos indígenas no Nordeste e de setores da sociedade civil, como o Conselho Indigenista Missionário/ CIMI, órgão da Igreja Católica/CNBB, os Xukuru iniciaram a retomada de seu território tradicional, reocupando áreas de várias fazendas até então nas mãos de posseiros. Ainda na mesma década os Xukuru escolheram se autodenominarem Xukuru do Ororubá, para não serem confundidos com os Xukuru-Kariri na sua maioria habitantes em Palmeira dos Índios/AL. Além de ser uma liderança carismática para o seu povo, a atuação do Cacique “Xicão” foi bastante significativa para o povo Xukuru. Sob sua liderança os Xukuru pressionaram os órgãos públicos pelo reconhecimento de seus direitos e a demarcação de suas terras. Sob sua liderança as áreas do território indígena foram retomadas das mãos dos fazendeiros, permitindo que os indígenas pudessem plantar e colher superando a miséria, a fome de anos e voltarem a ter dignidade. A atuação do Cacique “Xicão” provocou a ira dos fazendeiros, da oligarquia de Pesqueira formada por tradicionais invasores das terras Xukuru, financiadores de um pistoleiro que assassinou o Cacique em 20/05/1998. Nos anos seguintes outras lideranças Xukuru como “Xico Quelé” morto numa emboscada em 2001, foram também assassinadas. As práticas religiosas Xukuru foram perseguidas e proibidas pela polícia a mando dos fazendeiros. A dança do Toré, por ser um ritual coletivo em que os índios se juntavam e podiam discutir a situação de opressão em que viviam também foi impedida pelos fazendeiros. Os Xukuru faziam seus rituais às escondidas nas matas, pois eram acusados de macumbeiros, como relatam os mais velhos. Com a reconquista das suas terras, oficialmente demarcadas pelo Governo Federal em 2001, os Xukuru puderam exercer livremente seus seculares rituais religiosos. No culto a São João os cristãos católicos lembram à tradição bíblica do santo profeta que buscou a justiça e a verdade. A lembrança do seu nascimento é uma animada festividade popular anualmente celebrada com as fogueiras, com o fogo que ilumina e purifica. Os Xukuru chama-o “Seu São João” ou ainda “Senhor São João”. O santo é também chamado “Caô”, uma influência da presença africana com os escravizados negros na Serra do Ororubá. Em setembro os Xukuru celebram também a Festa de São Miguel, santo que nomeia o salão que abriga os índios quando eles vêm participar de reuniões e de festividades na Vila de Cimbres. São Miguel é o arcanjo que anunciou o nascimento Jesus, o primo de São João. São Miguel é sempre representado com uma espada simbolizando a Justiça. O mensageiro da justiça divina. Nessas festas religiosas os Xukuru se apropriaram dos santos católicos romanos e atribuíram a eles novos significados. A história, as vidas desses dois são relidas, rememoradas a partir dos horizontes e interesses da história Xukuru, da situação em que vivem os índios. São João e São Miguel foram incorporados aos cultos Xukuru como símbolos da justiça, diante das injustiças e perseguições contra os índios. Como símbolos de força, coragem e incentivo para os Xukuru se mobilizarem pelos seus direitos. Na festa de São João os Xukuru comparecem anualmente a Vila de Cimbres com seus adornos que são vestidos especialmente nesses momentos festivos. A Festa de São João além de ser uma expressão da cultura, por meio dos rituais religiosos, é antes de tudo uma forma de afirmação da identidade indígena Xukuru do Ororubá.